Em tempos de grande pressão sobre as empresas para se tornarem mais sustentáveis, mais eficientes e mais tecnológicas, é fácil cair na tentação de começar a transformação pelos sistemas ou pelos processos. Mas a verdadeira pergunta é: quem é que opera os sistemas, desenha os processos, toma decisões e carrega a cultura da empresa às costas todos os dias? A resposta é simples: as pessoas.
A cultura organizacional não se escreve em apresentações. Vive-se nas interações do dia a dia, nas decisões discretas, nas pequenas escolhas que cada colaborador faz quando ninguém está a ver. É isso que torna a cultura o fator mais determinante e, ao mesmo tempo, o mais negligenciado em muitas estratégias de transformação. E se queremos resultados consistentes e duradouros, temos de iniciar por onde tudo começa: pelas pessoas. Uma empresa com uma cultura forte, centrada nas pessoas, tem um solo fértil onde qualquer semente de inovação, sustentabilidade ou excelência operacional pode crescer com saúde. Por outro lado, culturas tóxicas ou descoordenadas sufocam qualquer tentativa de melhoria – por mais bem desenhada que esteja. Porque o problema nunca é apenas o processo, é o comportamento que o sustenta.
Transformar a cultura, então, não é impor novos valores – é criar condições para que as pessoas mudem a forma como pensam, trabalham e se relacionam. Isso significa criar ambientes de confiança, onde o erro é uma oportunidade e não uma punição. Significa dar autonomia, mas também direção. E significa, acima de tudo, envolver as pessoas no propósito da organização, para que se sintam parte da solução. Quando isso acontece, o impacto é visível. Equipas mais motivadas e alinhadas tornam-se naturalmente mais eficientes. Reduzem desperdícios, encontram melhorias operacionais e abraçam novas tecnologias com mais facilidade. O turnover diminui, o absentismo baixa e os indicadores ESG ganham substância – porque deixaram de ser objetivos externos e passaram a ser reflexo de uma cultura interna viva e coerente.
É por isso que a sustentabilidade empresarial verdadeira não começa com o carbono nem com os KPI – começa com uma pergunta simples: como tratamos as nossas pessoas? Damos-lhes espaço para pensar? Para propor? Para crescer? Sabem qual é o impacto do seu trabalho no cliente, no planeta e na estratégia da empresa? Se a resposta for “não”, então é aí que está o primeiro bloqueio à transformação.
A tecnologia, a automatização e os sistemas são, sem dúvida, aceleradores poderosos. Mas só funcionam se forem acompanhados por uma cultura preparada. De nada serve implementar um WMS, por exemplo, se quem o opera não confia no sistema, não entende os seus benefícios ou, pior ainda, não se sente valorizado no processo de mudança. A cultura é o terreno onde a tecnologia vai cair – e vai germinar ou secar, dependendo da preparação das pessoas. Esta transformação não se faz de fora para dentro, nem de cima para baixo. Faz-se de dentro para fora, e começa na liderança. Líderes que escutam, que dão o exemplo, que reconhecem o esforço e que investem tempo a construir relações humanas fortes são os verdadeiros catalisadores da mudança cultural. São eles que desbloqueiam a energia coletiva da organização – e sem essa energia, não há plano que resista.
A sustentabilidade que nasce das pessoas é mais difícil de medir, mas é infinitamente mais poderosa. Porque não precisa de ser empurrada – espalha-se. É vivida com autenticidade, é adaptável a cada realidade, e não depende de modas ou pressões externas. É uma forma de estar. E quando a cultura da organização atinge esse ponto, os resultados deixam de ser perseguidos… e passam a ser consequência.
No fundo, a cultura é o reflexo daquilo em que acreditamos – e o futuro da sustentabilidade empresarial está nas mãos das empresas que acreditam, verdadeiramente, nas suas pessoas. Porque quando colocamos as pessoas no centro, tudo o resto vem por acréscimo. E esse “tudo” é o que transforma uma organização comum numa organização extraordinária. Mas há uma dimensão que muitas vezes fica fora do radar: a emoção. As pessoas não se movem apenas por lógica ou incentivos racionais – movem-se por segurança, por orgulho, por sentido de pertença. Uma cultura que respeita esta dimensão emocional é uma cultura mais humana, e por isso, mais poderosa. É nos momentos de tensão, de mudança ou de falha que se revela a verdadeira força de uma cultura – e, por consequência, da empresa.
A resistência à mudança, tantas vezes apontada como um obstáculo, é frequentemente um reflexo de culturas que não escutam, que não envolvem ou que não explicam o “porquê” das decisões. Quando as pessoas são tratadas como peças de um processo, reagem com desconfiança. Quando são tratadas como seres humanos que fazem parte da construção do futuro, respondem com responsabilidade e energia. Por isso, o foco nas pessoas não é uma questão de “boas práticas de gestão de talento” – é uma questão estratégica. É o verdadeiro motor da transformação. Organizações que investem na maturidade cultural das suas equipas estão a investir na solidez do seu modelo de negócio, na sua capacidade de adaptação e na sua relevância futura. Estão a construir um património invisível, mas vital.
E esse património chama-se confiança. Confiança para experimentar, para colaborar, para crescer. Confiança entre colegas, entre equipas, entre departamentos. Confiança entre o que se diz e o que se faz. É essa confiança que, dia após dia, transforma cultura em vantagem competitiva. E quando damos esse primeiro passo – colocar as pessoas no centro – tudo o resto começa, naturalmente, a alinhar-se.
Pedro Ferreira Queimado, Fundador e Consultor Sénior de Eficiência | KronoLog Solutions