O Seminário de Compras, evento da Supply Chain Magazine, que decorreu ontem no Porto, centrou-se no impacto que a transformação digital está a ter na área das compras. Uma tarde durante a qual os mais de 70 profissionais presentes na sala tiveram oportunidade de ficar a conhecer o que está a ser feito no terreno por diferentes entidades.

Momento alto de partilha de experiências e ideias foi sem dúvida a mesa redonda na qual participaram Henrique Lorenzo Mota, Procurement and Stock Manager da Trofa Saúde, Acácio Figueiredo, Supply Chain Director da Microplásticos, Luís Sobral, Operations Manager do Mercado Electrônico, e Pedro Sá, Purchasing & Logistics Manager da Pinto Brasil Group, que contou com Gisele Villas Boas, Coordenadora da Área de Competitividade, da Relais Internacional, como moderadora.

O acesso ao digital facilita todo um trabalho desta área mas, em simultâneo, também o complica: existem mais propostas disponíveis e uma maior oferta requer uma escolha mais ponderada. Hoje existem diversas plataformas de comparação de preços, de contacto com fornecedores, de gestão de aprovisionamento, etc. que ajudam os profissionais do sector a encontrar os produtos correspondentes às suas necessidades. Mas isso não é tudo nesta área, e os nossos oradores explicaram-no muito bem.

“A principal pergunta do departamento de compras é ‘porquê?’: porque é que compras isto, porque é que compras a este fornecedor e porque é que compras a este preço?” – Luís Sobral, Operation Manager do Mercado Electrônico.

“Para responder a todos estes porquês é necessária a centralização”, explica Acácio Figueiredo, “por vezes a compra de alguns componentes não foram negociados por nós, foram negociados no âmbito da gestão do projecto, com o cliente final, e por vezes trabalhamos com fornecedores e com produtos impostos pelo nosso cliente”. Deste modo, e embora saiba que no mercado possam existir outras opções mais económicas, Acácio conta que na Microplásticos estão a criar um departamento de compras por excelência, para terem um controlo maior nos custos da empresa.

“Centralização eu diria que é uma palavra fundamental para as compras nos dias de hoje.” – Acácio Figueiredo, Supply Chain Director da Microplásticos

Henrique Lorenzo Mota concorda que a centralização das compras proporciona imensos ganhos e é um foco a ter numa empresa, considerando ainda que no conceito actual da Trofa Saúde, não funcionaria de outra forma. Apoia também a ideia de que as compras por vezes actuam de acordo com as necessidades da estrutura do grupo, pois na área da saúde as necessidades partem dos médicos e dos doentes.

“Da mesma maneira que as unidades não têm autonomia nos processos de compra em si, nós também não temos autonomia na escolha total do produto final, principalmente nas áreas de clínica.” – Henrique Lorenzo Mota, Procurement and Stock Manager na Trofa Saúde.

Na área da farmácia, Henrique conta que por vezes há um medicamento que, devido às suas especificidades, tem um único fornecedor, e como tal torna-se incontornável para o departamento de compras. Na sua realidade, considera que para as empresas de média e grande dimensão os ERP são o básico para a gestão das compras, e que seria impossível integrar 12 unidades hospitalares sem um sistema de integração completa que ligasse praticamente todos os departamentos, não só o das compras.

No ponto de vista de Pedro Sá, a transformação digital transcende os ERP, e embora tenham entrado há pouco tempo, já se estão a tornar ultrapassados. “Nós temos muito pouco tempo para reagir às necessidades do nosso cliente, sendo nós uma empresa que desenvolve para a indústria automóvel com muita base tecnológica, nós temos muitos artigos técnicos que tanto eu como a minha equipa de compras e logística, muitas vezes não sabemos muito do que estamos a comprar naquela altura, e todos esses conhecimentos que nós deveríamos ter na altura da compra são feitos de uma forma muito rápida”.

“O básico para nós acho que é mesmo a possibilidade de sabermos quando compramos, onde compramos e os tempos de entrega, porque tudo o resto é algo que é feito em qualquer empresa.” – Pedro Sá, Purchasing & Logistics Manager da Pinto Brasil Group

Para Pedro Sá, a tecnologia evolui muito depressa, e muitas das ferramentas que existiam há poucos anos e considerávamos imprescindíveis, já estão hoje a tornar-se coisas do passado, como os ERP ou e-mails directos. “Hoje em dia nós já nem valorizamos sequer essa ferramenta, já nos esquecemos do papel e da caneta, e tudo isso hoje, que é básico, e provavelmente tudo aquilo em que iremos falar hoje, daqui a cinco anos já estará ultrapassado”, afirma o responsável.

“As especificidades técnicas, não são responsabilidade das compras, mas relativamente ao processo de negociação, quem manda são as compras”, defende Luís Sobral, e explica que um passo muito importante na digitalização é o know-how de compras, o qual não pode ser individual, e sim empresarial. Conta quando há uns anos uma empresa perdeu todo o departamento de compras de uma só vez. Ficaram, apenas os ficheiros que poucos sabiam descodificar, por conterem um know-how individual.

Acácio conta que uma das grandes dificuldades que sentem nas suas compras são alguns tipos de produtos metálicos, que levam tratamentos térmicos e que compram com lead times de 50 a 60 semanas, o que faz com que haja um factor de risco muito grande, por não terem muitas vezes forecasts suficientes para garantir esse tempo. “O factor de risco está sempre presente nesta questão de digitalização. Para nós um grande factor de risco é precisamente esse, os lead times enormes que temos. Quanto maior o lead time, maior é o risco.”

Quando questionados pela audiência sobre a viabilidade das compras em conjunto, o nosso painel de convidados admite que em algumas áreas poderia não ser concebível devido a grandes especificidades, mas que, no caso da saúde, exemplo utilizado por Henrique Mota, algumas pequenas e médias farmácias o fazem, porque “caso contrário podem não ter acesso às grandes distribuidoras”, enquanto que no caso das grandes, estas o devem conseguir e assim evitam partilhar informações com outras concorrentes.