Durante anos, preparámo-nos para sermos eficientes. Agora, precisamos de estar preparados para o imprevisto. Durante décadas, o modelo Just in Time (JIT) foi o símbolo maior da eficiência industrial. Ao eliminar stocks excessivos e desperdícios, permitiu reduzir custos, aumentar a produtividade e sincronizar produção e consumo com uma precisão quase cirúrgica. No entanto, o JIT nasceu num contexto específico, altamente controlado, com cadeias curtas, fluxos previsíveis e baixo risco de disrupção. Embora, académica e empresarialmente continuemos a olhar para o JIT como uma metodologia a aplicar em determinados artigos, o contexto em que o conceito surgiu já não existe.

O panorama atual do mundo é marcado por instabilidade sistémica. As cadeias de abastecimento tornaram-se globais, interdependentes e expostas a riscos de natureza diversa: desastres naturais, pandemias, conflitos geopolíticos, flutuações económicas, escassez de matérias-primas e mudanças abruptas na procura. A previsibilidade — pilar do Just in Time — ruiu. O que assistimos é a uma pressão transversal, que afeta todas as indústrias

A exigência dos mercados é crescente e imediata. O consumidor final, empoderado por tecnologias digitais, habituou-se a entregas no dia seguinte, senão no próprio dia. A tolerância ao erro ou à espera praticamente desapareceu. Este comportamento de consumo, embora invisível na fábrica, exerce uma força colossal sobre todos os elos da cadeia.

Nesta realidade, surgiu-me uma pergunta fundamental: estaremos a perseguir um modelo ultrapassado? Não será que ao invés de um foco em Just in Time se deveria substituir por um foco em Just in Case?

Não se trata de uma proposta logística no sentido clássico, mas de uma filosofia de preparação consciente para a incerteza. Em vez de desenharmos operações apenas com base na eficiência e na eliminação do “desnecessário”, talvez devamos começar a perguntar: e se…?

  • E se houver uma rutura súbita de fornecimento?
  • E se um evento climático interromper a distribuição?
  • E se a procura duplicar em 72 horas?

O que defendo não é um retorno ao excesso, mas sim à prudência estratégica. Manter capacidades alternativas, diversificar fornecedores, garantir visibilidade end-to-end, investir em planeamento de cenários e fomentar uma cultura organizacional preparada para reagir com rapidez e inteligência.

A tecnologia tem um papel decisivo, mas não exclusivo. Ferramentas preditivas, inteligência artificial e digital twins são aliados preciosos, porém, sem pensamento crítico e visão humana, não bastam. Porque a incerteza não se resolve apenas com dados: exige liderança consciente.

O verdadeiro desafio, na minha visão, é este: como desenhar cadeias de abastecimento que não sejam apenas eficientes em condições ideais, mas eficazes em condições reais?

O Just in Time continua a ter o seu lugar. Mas talvez não mais como objetivo último — e sim como uma inspiração operacional, a ser equilibrada com outras dimensões igualmente vitais: robustez, agilidade, adaptabilidade.

Não proponho abandonar o passado, mas redesenhar o futuro com base no presente.

Just in Case, para mim, é isso: uma nova lente estratégica que conjuga inteligência, precaução e prontidão. Uma abordagem que assume que as disrupções vieram para ficar, e que a verdadeira vantagem competitiva está em antecipar e preparar.

Porque, num mundo onde a pergunta não é “se” vai acontecer algo inesperado, mas sim “quando”, estar preparado deixa de ser uma opção — passa a ser uma obrigação.

 

Sandra Durães, Service Manager | Logista Pharma · Professora Convidada na Licenciatura em Gestão da Distribuição e da Logística (ESCE, IPS)

 

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