A discussão sobre obsolescência no setor logístico europeu tem-se intensificado nos últimos anos, sobretudo num contexto de crescente modernização dos ativos. A obsolescência — quando um armazém ou ativo deixa de estar adaptado às exigências técnicas ou operacionais dos ocupantes modernos — tornou-se um tema central, revelando um mercado europeu cada vez mais segmentado. A chamada two-tier market evidencia-se nos países onde há abundância de stock: os ativos de primeira linha mantêm rendas elevadas e baixas taxas de desocupação, enquanto os imóveis obsoletos enfrentam taxas de desocupação superiores e rendas mais baixas.

Nos últimos anos, cerca de um terço dos ocupantes logísticos europeus – aproximadamente 32% – tem identificado a obsolescência como um dos principais desafios do setor, ainda que a proporção de ativos obsoletos nos portefólios venha a diminuir, sinalizando um esforço de modernização e reposicionamento do parque existente. Em paralelo, cresce também o número de critérios considerados relevantes nas decisões de expansão, com destaque para fatores relacionados ao próprio ativo – como eficiência energética, flexibilidade de espaço e sustentabilidade – que triplicaram em importância face a 2023. Estes dados refletem um mercado europeu mais exigente e seletivo, em que a qualidade e o desempenho técnico dos imóveis assumem um peso crescente na competitividade.

Portugal, no entanto, apresenta uma dinâmica distinta. A taxa de ocupação logística tem aumentado de forma desproporcional relativamente à adição de novo stock, criando um mercado de baixa disponibilidade estrutural. Lisboa e Porto ilustram bem este fenómeno, com taxas de desocupação na ordem dos 3.5% e 1%, respetivamente. Nesta situação, a pressão recai sobre os ocupantes, que competem por espaço, e não sobre os proprietários, como acontece em muitos mercados europeus com maior abundância de oferta.

Esta escassez de ativos disponíveis tem implicações diretas para a obsolescência. Em mercados saturados, a pressão para substituir ou atualizar ativos obsoletos é menor, porque os ocupantes priorizam a ocupação em detrimento da qualidade absoluta do espaço. Em Portugal, onde este cenário se aplica, a elevada procura e a oferta limitada fazem com que os ocupantes privilegiem a disponibilidade e a localização, mesmo que isso implique optar por espaços menos modernos. Assim, a obsolescência, embora presente, não exerce uma pressão significativa a curto e médio prazo.

Outro ponto relevante é a intenção de expansão dos operadores logísticos. Quase metade dos ocupantes planeia aumentar a sua operação nos próximos três anos, sendo que mais de 20% prevê fazê-lo em mais de 10%. Em Portugal, a tendência é semelhante, 51% pretendem aumentar o seu parque logístico, enquanto 44% planeiam mantê-lo e apenas uma minoria antecipa reduções. No nosso país as decisões de expansão continuam a ser determinadas, sobretudo, por fatores de localização – acessos rodoviários, proximidade aos principais eixos de distribuição e ao consumidor. As características técnicas do ativo — sustentabilidade, eficiência e segurança — surgem em segundo plano, o que reforça a ideia de que, num mercado de baixa disponibilidade, a prioridade é assegurar espaço, ainda que não seja o ativo ideal.

Portugal vive, desta forma, um paradoxo interessante: num contexto de forte procura e escassez de imóveis, a obsolescência existe, mas não condiciona o funcionamento do mercado. Ao contrário da Europa continental, onde o two-tier market acentua desigualdades entre ativos novos e antigos, o mercado português mantém-se relativamente homogéneo e equilibrado, com a pressão focada na ocupação e não na modernização. Este cenário sugere que a obsolescência só se tornará uma questão premente quando o mercado atingir níveis de oferta mais equilibrados, permitindo aos ocupantes selecionar com maior critério os ativos que melhor se adequam às suas necessidades.

O comportamento português revela que a escassez de stock funciona como um amortecedor natural da obsolescência, mantendo os imóveis antigos ocupados e garantindo rendas estáveis ou em crescimento. Enquanto a procura continuar a superar a oferta, a prioridade dos ocupantes será encontrar o espaço, e não modernizá-lo. Só quando o mercado atingir um maior equilíbrio entre a oferta e a procura é que a modernização e a eficiência técnica dos ativos passarão a ser fatores decisivos na estratégia de expansão e investimento.

Nuno Torcato, Leasing Industrial & Logistics Director | CBRE Portugal