Na linha da frente, profissionais de saúde combatem o Covid-19. Contudo, há outros inimigos invisíveis que se enfrentam, dia e noite, no silêncio dos bastidores: o tempo, o curto tempo de acção de quem tem a missão de fazer chegar, custe o que custar, carga que é essencial no combate à pandemia e… o tempo da burocracia. É que não podem ser descuradas formalidades, papéis, trâmites e requisitos legais comuns a qualquer importação de bens, mesmo sendo de emergência. Está a ser uma ajuda de PESO a que os transitários estão a dar.

A situação é de emergência nacional e mandaram-nos resguardarmo-nos, trabalhar remotamente e evitar o contacto social. Mas, para que isso seja possível há profissionais que estão operacionais e ligados 24 horas por dia, sete dias na semana, trabalhando a contra-relógio, como é o caso da KLOG Transport Solutions, através da sua divisão Air&Sea, que tem estado directamente envolvida na gestão de vários processos de importação em larga escala de material de protecção individual para os profissionais de saúde nacionais que combatem a pandemia.

É sábado. Quando chegamos pela manhã ao terminal da Portway, são quatro os camiões da KLOG que estão encostados e a aguardar pela preciosa carga que chegou à Portela naquela madrugada, vinda de Xangai. Este prestador de serviços logísticos, mandatado pelo grupo Luz Saúde, fretou um avião cargueiro Boeing 757 para trazer para Portugal diverso material de protecção individual e de recolha de amostras, para ajuda no combate ao Covid-19.

Sérgio Namora é o responsável pela gestão das operações da empresa em Lisboa e o homem que no terreno está a coordenar a operação. “A grande maioria deste material que chegou destina-se aos profissionais do Serviço Nacional de Saúde, que estão na linha da frente no combate diário a esta pandemia”, diz-nos. Da lista de carga do avião, que totaliza cerca de 200 m3 de carga com 24 toneladas de peso bruto, constam 3 milhões e meio de máscaras cirúrgicas, mais de 100.000 kits de zaragatoas para colheita de amostras utilizadas para testar infecções de Covid-19, 1.500 batas descartáveis e mais de 500.000 máscaras de protecção individual FFP2/KN95.

Este é já o segundo voo gerido pela KLOG no âmbito desta situação de emergência nacional. “Fomos também responsáveis pela gestão logística do avião A330 de passageiros da TAP que efectuou nos dias 29 e 30 de Março os voos mais longos da sua história para ir buscar material de protecção individual à China”. Um avião que trouxe mais de 160 m3 de carga com cerca de 16 toneladas, contendo máscaras de protecção individual FFP2/KN95, fatos completos de protecção, máscaras cirúrgicas e kits de detecção do Covid-19”.

 

Disponibilidade 24/7

Nestas operações, uma das maiores complexidades é a urgência. Sérgio Namora explica que “muita desta carga está a ser recolhida em diversos pontos, pois estamos a consolidar o máximo de carga possível do maior número possível de fornecedores, e o que acaba por acontecer é que nem sempre a documentação vem correcta como era suposto, o que em termos práticos nos gera alguns constrangimentos alfandegários e tempos de espera maiores do que desejaríamos”. Ainda assim, Sérgio sublinha que todos procuram ser “colaborativos e flexíveis”.

São processos que envolvem diferentes entidades, múltiplos fornecedores e muitos clientes em simultâneo. “No caso do primeiro carregamento, o que veio com a TAP, tínhamos seis fornecedores dentro do avião; hoje, neste voo, são cinco fornecedores diferentes. É determinante no êxito da operação a comunicação com o nosso agente local, que por sua vez tem que ser muito proactivo no contacto com os diversos fornecedores e depois fazer a ponte para a companhia aérea. Em cada um dos casos tivemos no terreno uma pessoa que tem que ter uma perspectiva global da operação, focada e disponível 24 horas por dia para que nada falhe”.

Estamos a falar de países com fusos horários diferentes, pelo que pôr o despertador para as 02h00 da manhã é o novo normal de Sérgio Namora. É a essa hora que estão a começar a trabalhar na China e é preciso saber se tudo está a decorrer de acordo com o planeado ou se é necessário fazer algum ajustamento ao plano traçado.

“Neste momento temos mais quatro voos previstos até Maio. O de dia 17 de Abril deverá ser um 747 Jumbo, um avião com 650 m3 de capacidade”, diz o responsável da KLOG, que sabe bem que, daqui até Maio, ele e a sua equipa ainda têm muitos dias longos pela frente.

“Na China, então, tudo tem que estar certo em termos de documentação, caso contrário a carga não sai”, diz-nos Cátia Santos, Air Business Development Manager da KLOG. Este é o terceiro carregamento que Cátia acompanha. “O primeiro foi um voo que trazia carga repartida com outros transitários, depois foi o da TAP e agora este Boeing. Hoje à noite temos outro, também de carga parcial”, explica-nos. “Aliás, para este cliente vamos ter mais quatro voos, como o Sérgio referiu, mas aqui pelo meio haverá também voos de carga parcial. Por outro lado, temos carga do nosso parceiro global, a Geodis, que está a ir para Frankfurt, Bruxelas, Liège…” São também charters mas que em vez de voarem directamente para Portugal vão para outro aeroporto europeu, que funciona como hub, onde a carga é desconsolidada e onde a KLOG vai em seguida com os seus camiões recolhê-la, trazendo-a para Portugal e procedendo à sua distribuição.

 

Todos no mesmo barco

Apesar dos anos de experiência profissional que já tem, Sérgio Namora sabe que a situação que está a viver é única. “Nunca foi tão urgente colocar mercadoria no país, desta forma e nestas quantidades”. Pois, este é um daqueles raros momentos da história em que todos estão no mesmo barco. “Em contexto normal, estamos a falar de carga que viria, mas contentorizada e em navios. Aquilo que traríamos em contentores está a ser colocado com urgência em aviões e o mesmo se passa com os fornecedores que, também eles, estão habituados é a fazer o transporte marítimo desta carga, o que mais uma vez vem tocar na importância da documentação e na garantia de que legalmente tudo está correcto. Nunca me vi envolvido profissionalmente numa operação em que tivesse tanta responsabilidade e tanta urgência”, assume. E, de facto, é uma situação inédita para o transporte internacional.

A urgência é evidente e todos a sentimos. Para o nosso interlocutor há uma outra palavra que define na perfeição este dias sem guião que tem vivido e o que sente no terreno. “Por parte do cliente, por parte dos nossos fornecedores de serviços na China, dos nossos fornecedores em Portugal e de todos os agentes envolvidos há uma grande solidariedade. Temos tido despachantes que cedem os seus serviços de forma gratuita para ajudar, nós próprios fornecemos alguns serviços no âmbito deste processo, que normalmente seriam cobrados, a empresa de chartering tem sido incansável… a TAP, tanto neste embarque, como no anterior tem ajudado imenso. E até a própria alfândega. Não é fácil para eles que por natureza são extremamente rigorosos e exigentes em termos de documentação – e continuam a sê-lo – mas ajudando-nos a encontrar o caminho, o melhor caminho para que, da forma mais acelerada e correcta, as mercadorias possam ser libertadas e encaminhadas para quem no terreno precisa tanto delas”.

É essa mesma solidariedade por parte de todos que, em boa medida, acaba por compensar o cansaço e desgaste de quem está envolvido nestas operações. É que os dias que a equipa da KLOG tem vivido parecem elásticos. Esticam como se as 24 horas não existissem, mas são encarados com um enorme espírito de equipa, entreajuda e boa disposição.

Há que cumprir os trâmites legais, como ter as SDS para poder obter o despacho. Só depois disso é que sai da alfândega a primeira carga, 88 kg, que prontamente são carregados num dos quatro camiões que já ali aguardam há umas boas horas. Novo compasso de espera. Tudo tem que ser analisado e verificado ao pormenor. Faltam mais umas autorizações e há que aguardar. O sentido de missão é bem perceptível e o telemóvel sempre à mão a ferramenta indispensável.

Ainda não são duas da tarde quando Cátia Santos surge com os papéis na mão:

– Já está!

É a luz verde que faltava nesta corrida contra o tempo e contra a burocracia. O desígnio é de força maior e ali todos estão preparados para dar o seu melhor, gerir imponderáveis e encontrar a solução para conseguirem colocar nos camiões a carga o mais rapidamente possível.

Logo à noite há mais. São apenas umas horas de descanso até à chegada do próximo avião.