A logística europeia vive um ponto de viragem silencioso. A tecnologia deixou de ser apenas uma ferramenta operacional para se tornar a infraestrutura essencial da decisão. Mas, no centro desta transformação, continua a estar o fator humano, aquele que distingue quem apenas automatiza de quem realmente evolui. Conheça a opinião de Jorge Mendes, diretor-geral do HIPOGroup, sobre o papel decisivo da tecnologia e das pessoas na construção da nova logística europeia.
A logística europeia atravessa um ponto de inflexão que poucos ainda verbalizam, mas que todos já sentem. Os sistemas deixaram de se limitar a registar — agora antecipam. A tecnologia deixou de ser uma ferramenta operacional e passou a constituir a infraestrutura essencial da decisão.
Esta mudança redefine não apenas custos e prazos, mas também o modo como as empresas constroem confiança. Num setor onde a margem de erro é cada vez mais curta, a diferença entre reagir e prever tornou-se o verdadeiro diferencial competitivo.
As cinco forças que estão a reconfigurar o setor
1. Digitalização integral
A automação deixou de ser um upgrade tecnológico para se tornar um imperativo de gestão. Quando os dados fluem entre sistemas, também as equipas precisam de aprender a fluir entre funções. A revolução digital não é apenas técnica — é cultural.
2. Inteligência preditiva
A previsão já não é luxo: é a diferença entre cumprir e justificar. Modelos de IA e algoritmos de previsão reduzem atrasos, antecipam gargalos e redefinem a noção de planeamento. O desafio não está na tecnologia, mas em saber o que deve — ou não — ser automatizado.
3. Capital humano híbrido
A escassez no setor não é apenas de motoristas, é de competências. Operar uma cadeia digital exige perfis técnicos, analíticos e relacionais — pessoas capazes de ler dados e traduzi-los em ação. A nova logística é humana e digital ao mesmo tempo.
4. Sustentabilidade estratégica
A sustentabilidade deixou de ser uma questão ambiental para se tornar económica. O que reduz emissões, reduz custos. Rotas otimizadas e controlo energético passaram a métricas de eficiência, e não apenas de responsabilidade social.
5. Risco e resiliência
Quanto mais digital a operação, mais crítica a governação de riscos e investimentos. Sistemas interligados trazem vulnerabilidades novas — ciberataques, falhas sistémicas, dependência de plataformas externas. A tecnologia amplia tanto os ganhos como as fragilidades, exigindo agilidade estratégica para equilibrar ambos.
O que muda na decisão: três implicações práticas
A. Do controlo à orquestração
O gestor logístico já não “controla exceções”: desenha sistemas que as evitam. A eficiência nasce antes do problema — não depois.
B. Dashboards com propósito
Demasiada informação mata a análise. A pergunta certa vale mais do que cem indicadores. Cada métrica precisa de um dono: se não influencia uma decisão, é ruído.
C. Talento como vantagem operacional
Duas empresas podem usar as mesmas ferramentas e alcançar resultados opostos. O diferencial está na coordenação entre tecnologia, processos e pessoas. A automação não elimina o talento — redefine-o.
Cinco perguntas para quem decide
Que decisões operacionais podem migrar para modelos preditivos nos próximos 90 dias?
Onde é que estamos a simplificar — e onde apenas digitalizamos a complexidade?
Como equilibramos investimento tecnológico com governação de riscos?
Que competências precisamos de formar internamente para usar tecnologia com discernimento?
Estamos a medir eficiência ou apenas velocidade?
A confiança continua a ser o ativo mais difícil de digitalizar. A próxima década não será sobre o que a IA pode fazer, mas sobre o que devemos permitir que decida. A logística continuará a ser o coração da economia europeia, mas o seu verdadeiro pulso virá da coordenação inteligente entre dados e discernimento. Tecnologia decide. Pessoas transformam. A eficiência é digital, mas a confiança permanece humana.
Jorge Mendes, Diretor-geral | HIPOGroup – Cargo Logistics Solutions



