As empresas portuguesas já olham para as compras como pilar estratégico, com as respetivas equipas a apresentarem boa performance operacional, mas lacunas a nível da integração e da colaboração. Além disso, ainda não possuem um roadmap para o investimento em tecnologia e enfrentam dificuldades na atração de talento e gestão de carreiras.

Estas são as principais conclusões do EY Procurement Survey 2025, desenvolvido para avaliar a maturidade das equipas de compras com foco no mercado português e apresentado na Procurement Conference 2025, esta segunda-feira, 6 de outubro, por João Queirós, senior manager de Supply Chain & Operations da consultora Ernst & Young.

O especialista enfatizou, a propósito, o facto de este estudo ser centrado nas equipas de procurement portuguesas, na convicção de que “uma equipa de compras altamente profissionalizada pode fazer a diferença entre o sucesso e o insucesso de uma organização”. Daí que o primeiro passo tenha sido tentar perceber em que medidas a função é relevante ou olhada apenas como pessoas que processam ordens de compra.  Em resposta, 88% das empresas inquiridas assumiu que as compras constituem um departamento fundamental, muito embora evidenciando níveis de maturidade distintos.  No mais avançado, a função é gerida pela liderança sénior (40%), enquanto, no mais básico, a função ainda não é vista como estratégica (2,8%).

O estudo debruçou-se também sobre o nível de maturidade a nível de processos, pessoas, tecnologias, dados e métricas, para concluir, nas palavras de João Queirós, que as organizações estão “razoavelmente alinhadas e até bastante avançadas” no que toca a incorporação das melhores práticas nos processos, que tem “sido feito um esforço” na gestão das pessoas, e que reconhecem a importância dos dados e métricas para apoiar a tomada de decisão. A maior fragilidade prende-se com a tecnologia, com as equipas a reconhecerem as suas limitações e a trabalhar ativamente no desenvolvimento de soluções para as superar. Por conseguinte, esta é a categoria com maior potencial para evolução. Ainda no que toca ao futuro, foi manifestada a vontade de consolidar as práticas existentes em matéria de processos, dados e métricos, sendo que, no que respeita as pessoas, existe consciência da necessidade de aumentar a retenção de talento, embora a ambição das equipas de compras esteja limitada pelas políticas globais das empresas.

Além das componentes essenciais, a EY avaliou a maturidade das práticas do ponto de vista operacional, tendo, para isso, desenhado uma viagem que abrange os principais tópicos da função, desde a gestão de categorias até à formalização dos processos de compra. Para concluir – segundo João Queirós – que, de uma forma geral, se verifica um nível de maturidade intermédio indicativo de estabilidade operacional. “Na negociação, somos fortes, as equipas conseguem utilizar mecanismos criativos para negociar para lá do preço”, exemplificou. A negociação, tal como as ordens de compra e a definição de objetivos, são as etapas desta viagem melhor classificadas (próximo do nível avançado de maturidade). A maior dificuldade emerge na integração: “Continuamos a olhar muito para a nossa organização e a ter alguma dificuldade em olhar para os fornecedores como a extensão da nossa organização, alguma dificuldade em trabalhar com eles de forma a otimizar a supply chain. É que, quando otimizamos a supply chain, obtemos os verdadeiros ganhos que conseguimos transferir para o cliente final”, enquadrou.

O estudo focou-se, igualmente, nas tendências e nos respetivos desafios. A começar pela tecnologia e, em particular, a Inteligência Artificial (IA). E para concluir que existe um desalinhamento entre o que é planeado e o que é executado. Na prática, isto significa que 83% das equipas afirma pretender investir nestas ferramentas, reconhecendo o seu potencial para transformar a função, mas 68% ainda não sabe como endereçar este tema, isto é, como aplicar o investimento. A propósito, o especialista da EY citou um estudo recente do MIT (Massachussets Institute of Technology), segundo o qual 95% dos processos de IA falha os objetivos de retorno financeiro. Em consequência, a recomendação é: “Explorem, mas de forma controlada, utilizada um piloto pequeno, contido, experimentem e cresçam a partir daí.”

Outro tópico neste capítulo é a sustentabilidade, com o estudo a concluir que a maioria das empresas consegue incorpora-la nos processos de compra, fazendo algum sourcing ético, com uma avaliação do fornecedor que vai além dos aspetos técnicos. As empresas mais maduras já influenciam as decisões de compra com base em critérios de sustentabilidade, mas 45% ainda está a dar os primeiros passos.

No que respeita a gestão de risco, a consultora identificou uma boa maturidade em geral, com as equipas de compra a conhecerem o conceito e adotar processos para mitigar o risco. Porém, apenas 2,9% dos inquiridos estão alinhados com as práticas líderes neste domínio.

Finalmente, as pessoas. A propósito, João Queirós sublinhou que se vivem tempos de crise em termos de competências, com as empresas a enfrentarem dificuldades na atração de talento: “Não é fácil atrair um jovem para esta carreira, o procurement não é a função mais sexy do mundo”, comentou. Existem, também, dificuldades na gestão de carreiras, tendo chamado a atenção para a mobilidade interna como resposta: “Fazer as pessoas de procurement passar por outras áreas da organização ajuda-as a perceber a realidade da empresa e a saber que o que vão comprar faz sentido. Dá-lhes competências para comprar melhor, mas também para desafiar os seus clientes internos”, defendeu.