Por que razão tantas empresas continuam a tratar os períodos de pico como um mal necessário, quando deveriam encará-los como a oportunidade definitiva para demonstrar excelência operacional? Estes períodos são uma realidade inevitável para empresas da cadeia de abastecimento. Seja no verão, na Black Friday ou na época de Natal, estas alturas expõem fragilidades e testam a resiliência das operações. O aumento exponencial de encomendas, a pressão por entregas rápidas e a necessidade de garantir uma experiência omnicanal consistente transformam a eficiência logística numa questão de sobrevivência.
Quando o ritmo acelera, os armazéns tornam-se o principal ponto de pressão. Multiplicam-se as entradas e saídas, cresce a rotatividade de stock e aumenta o número de encomendas. No entanto, é impressionante como muitos armazéns continuam a ser um dos elos menos modernizados da cadeia. É quase paradoxal: num mundo em que a inteligência artificial e a automação inteligente já são uma realidade, ainda há quem dependa de processos manuais ou sistemas pouco integrados para gerir operações críticas.
Este é, sem dúvida, um risco estratégico que nenhuma empresa pode ignorar. Mas, há uma boa notícia: as ferramentas para inverter esta realidade já estão ao alcance de todas as empresas.
Planeamento: a base para o sucesso
A preparação é tudo. Empresas que esperam pelos primeiros sinais de sobrecarga para agir já estão em desvantagem. Ferramentas de previsão de procura, alimentadas por IA, permitem antecipar picos com base em dados históricos e tendência de mercado, reduzindo riscos de stock e atrasos.
Mas, o planeamento não é apenas sobre tecnologia – é também sobre mentalidade. As empresas que encaram os períodos de pico como uma oportunidade, e não como um problema, estão mais bem posicionadas para inovar e liderar. Antecipar cenários, ajustar estratégias e alinhar equipas são passos fundamentais para transformar o caos em eficiência. Utilizar dados históricos para identificar padrões sazonais, testar diferentes volumes de procura antes que ocorram, garantir que todos os departamentos trabalham em sintonia e criar capacidade de resposta rápida a mudanças inesperadas são algumas estratégias de planeamento eficazes.
Tecnologia: a aliada decisiva
A tecnologia é, sem dúvida, o maior aliado das empresas de logística e supply chain. Um Sistema de Gestão de Armazéns (WMS) integrado no ERP é, hoje, essencial para transformar o caos em ordem. Não se trata apenas de gerir inventários ou otimizar fluxos de trabalho. Trata-se de transformar o armazém num centro de inovação, onde cada etapa da operação é monitorizada, analisada e ajustada em tempo real.
Etiquetas RFID, por exemplo, permitem inventários automáticos e rastreamento em tempo real – reduzindo erros e acelerando o processamento de encomendas –, enquanto a integração com blockchain assegura a rastreabilidade e a segurança dos dados, oferecendo uma camada adicional de transparência. Sensores inteligentes, conectados pela Internet of Things (IoT), monitorizam variáveis críticas como temperatura, humidade e vibração, emitindo alertas automáticos que previnem ruturas de stock ou falhas de qualidade. Já os robôs móveis autónomos, conhecidos como AMR, circulam de forma eficiente nos armazéns, transportando mercadorias e colaborando em segurança com as equipas humanas. E os gémeos digitais, que criam réplicas virtuais dos armazéns, permitem simular cenários, prever gargalos e redesenhar fluxos de trabalho antes que os problemas surjam.
Estas não são tecnologias futuristas – são ferramentas que já estão a ser utilizadas por empresas que entenderam que, em momentos de alta procura, a logística não é apenas uma função operacional, mas o motor que garante a continuidade e o sucesso das operações.
E, contrariamente ao que muitos pensam, estas soluções não estão reservadas apenas às grandes cadeias. Para as Pequenas e Médias Empresas (PME), que muitas vezes têm menos recursos para lidar com picos de procura, estas tecnologias escaláveis representam uma oportunidade única de competir em pé de igualdade. A acessibilidade destas ferramentas é, hoje, um divisor de águas. Empresas que hesitarem em modernizar-se correm o risco de ficar para trás num mercado em que a eficiência deixou de ser vantagem – passou a ser requisito mínimo.
A Inteligência Artificial como motor estratégico
A Inteligência Artificial vai muito além da automação. Ela aprende com os dados da operação, prevê a procura, otimiza rotas de picking e deteta padrões anómalos. Integrada com o ERP, a IA não só garante uma operação sincronizada, como também oferece uma capacidade de resposta instantânea – algo essencial em períodos de pico, onde cada segundo conta.
Neste contexto omnicanal, a IA transforma a logística de uma função operacional para um motor estratégico das empresas. É aqui que a diferença entre reagir e liderar se torna evidente. Empresas que utilizam a IA para antecipar desafios e ajustar operações em tempo real não apenas sobrevivem aos períodos de pico – elas prosperam.
Estará a operação logística das empresas preparada para o futuro?
Se, durante grande parte do ano, a operação pode ser gerida de forma estável, nos momentos de alta procura é a prontidão que dita o sucesso. Os picos de procura são desafios inevitáveis, mas a tecnologia oferece as ferramentas para enfrentá-los com eficiência. Quem investir hoje em soluções tecnológicas estará não só preparado para enfrentar os desafios imediatos, mas também para garantir a resiliência e o crescimento sustentável nos anos que virão.
A pergunta que fica, inevitavelmente, é: as empresas estão prontas para dar este passo? Porque, no final, não se trata apenas de sobreviver aos desafios. Trata-se de liderar, inovar e transformar desafios em oportunidades para crescer de forma sustentável.
Tiago Costa Lima, diretor de Produto da Cegid para PME e Escritórios de Contabilidade, em Portugal e África