Num mundo cada vez mais interligado e imprevisível, a digitalização das cadeias de abastecimento deixou de ser uma vantagem competitiva para se tornar num imperativo estratégico. A revolução silenciosa da Supply Chain 4.0, isto é, uma cadeia de abastecimento alavancada pela tecnologia, está a reformular os alicerces da indústria, exigindo uma nova abordagem baseada em tecnologia, colaboração e sustentabilidade.

Segundo um estudo recente do INEGI (Instituto de Ciência e Inovação em Engenharia Mecânica e Engenharia Industrial), entre 65% e 80% das empresas em Portugal afirmam ter algum grau de visibilidade sobre as suas cadeias de abastecimento. No entanto, no que toca à tecnologia, embora a maioria das empresas inquiridas utilize a cloud e quase um quarto recorra à Internet of Things (IoT), uma em cada cinco não mostra sinais de ter iniciado o processo de digitalização, e apenas 8,8% utiliza inteligência artificial.

Perante este cenário, importa refletir sobre o papel da tecnologia nas cadeias de abastecimento. Hoje, os novos desafios exigem respostas inovadoras, e é essencial dispor de ferramentas capazes de dar resposta a essa complexidade crescente. A era digital transporta consigo uma conjuntura sem precedentes: globalização, volatilidade da procura, riscos geopolíticos e exigências regulatórias que colocam as cadeias de abastecimento sob pressão constante. A pandemia veio apenas acelerar esta realidade, expondo fragilidades estruturais e forçando as empresas a repensarem os seus modelos operacionais.

Neste contexto, a digitalização deixou de ser uma opção para se tornar uma necessidade estratégica. A integração de tecnologias como a Inteligência Artificial, a IoT e a análise de dados em tempo real permitem construir cadeias mais resilientes, ágeis e inteligentes.

A adoção de soluções baseadas na cloud, representa um dos pilares fundamentais desta transformação. A cloud oferece escalabilidade, flexibilidade e acessibilidade, permitindo às empresas ajustarem rapidamente os seus recursos às flutuações do mercado, ao mesmo tempo que promove a colaboração entre equipas e parceiros distribuídos globalmente — algo essencial num ecossistema cada vez mais interligado. Mais do que uma simples infraestrutura, a cloud funciona como um facilitador de inovação. Permite testar novos modelos de negócio, integrar sistemas diversos e automatizar processos críticos como a gestão de inventário e o rastreamento de envios — tudo com maior precisão e menor custo.

A tecnologia existe para servir e apoiar decisões estratégicas, num cenário onde se torna essencial um sistema de gestão empresarial robusto e flexível. A centralização da informação elimina silos, melhora a comunicação entre departamentos e permite uma visão holística do negócio. Neste contexto, a arquitetura in-memory e a análise preditiva são ferramentas poderosas para antecipar tendências, otimizar operações e tomar decisões mais informadas. A visibilidade em tempo real sobre toda a cadeia de abastecimento, transforma dados em insights acionáveis, reduzindo tempos de resposta e aumentando a eficiência.

Com a digitalização, surgem também novos riscos, onde a cibersegurança e a conformidade regulatória assumem protagonismo e são hoje prioridades inadiáveis. A gestão eficaz destes riscos passa por estratégias como a monitorização em tempo real, a regionalização do abastecimento, a diversificação de fornecedores e a adoção de práticas sustentáveis.

A transparência e a rastreabilidade são agora exigências do mercado e da sociedade. A integração de práticas circulares e a utilização de tecnologias para simulação de cenários de risco são passos fundamentais para garantir uma cadeia de abastecimento mais responsável e preparada para o futuro.

Portugal está a alinhar-se com as tendências globais de Supply Chain 4.0, mas com uma abordagem adaptada à sua realidade económica e industrial. A combinação entre políticas públicas, inovação tecnológica e colaboração entre empresas será determinante para construir cadeias de abastecimento mais ágeis, sustentáveis e competitivas. No nosso país, da análise efetuada, os setores do retalho, da indústria alimentar e o farmacêutico, são os setores que se encontram entre os mais avançados na adoção de soluções de Supply Chain 4.0.

Esta não é uma visão distante — é uma realidade em construção. As organizações que souberem alinhar tecnologia, talento e estratégia, estarão melhor posicionadas para enfrentar os desafios do presente e aproveitar as oportunidades do futuro. A transformação digital da cadeia de abastecimento é, acima de tudo, uma jornada de adaptação contínua. E, como em qualquer jornada, o sucesso dependerá da capacidade de agir com visão, coragem e compromisso.

Helder Gomes | Manager de Soluções de Gestão empresarial | Minsait Portugal (Indra Group)