A aproximação dos mercados é um dos fatores potencializados pela a área da supply chain, e que tem uma importância fundamental. Nuno Torcato, director Industrial & Logistics da CBRE, iniciou com esta visão a sua intervenção na SCM Conference’ 25, afirmando que o setor logístico tem um grande potencial, e que as empresas estão a ser motivadas pela mudança da mentalidade dos consumidores e pela aproximação dos mercados.
No que diz respeito à ocupação de armazéns, de acordo com os dados da CBRE, as empresas que procuram estes espaços dão prioridade a acesso a centros de transporte, termos de arrendamento flexíveis e opções de expansão, certificações de sustentabilidade ambiental, e eficiência do espaço. Destacou ainda duas tendências importantes: o facto de a Europa estar num processo de reindustrialização – sustentado pelo crescimento da ocupação de espaços -, e o ‘Flight to Quality’, a procura por qualidade. Em Portugal, grande parte do stock logístico tem mais de 15 ou 20 anos, e embora seja facilmente arrendado, os investidores preferem os novos projetos. Entre 2023 e 2024, 80% dos novos projetos foram arrendados em fase de construção.
Tendo em conta a importância de aproximar mercados, Portugal e Espanha somam grandes vantagens ao colaborarem de forma estreita, mesmo que ainda haja trabalho a fazer. A Península Ibérica vive duas realidades no que toca à integração da supply chain, não obstantes as vantagens que advêm de encarar os dois mercados como um só. Esta foi a principal conclusão que emanou da mesa redonda “Oportunidades globais para a supply chain ibérica”.
A moderação do painel coube a Luís Santos, Industrial and Consumer Marketing director da KPMG, com a participação de Joaquim Vale, CEO da Santos & Vale, Raul Sanchez, Warehousing & Logistics manager na Sika, Christopher Corbin, Sales manager Iberia na Reflex Solutions, e Jan Schwietzke, Business manager Iberia na Arvato Systems.
Fazendo o enquadramento do tema, Luís Santos sublinhou que a Península Ibérica é um foco de dinamismo ibérico, na medida em que as duas economias foram responsáveis por 50% do crescimento do euro no último trimestre de 2024. Na sua perspetiva, no que concerne à logística, “a evolução futura não é facilmente decifrável”, atendendo a que serve dois segmentos: por um lado, o produtor, e, pelo outro, o consumidor. E, no primeiro caso, o que se verifica é que a onda de nearshoring que se antecipava em consequência da COVID-19 acabou por não se sentir ao nível do trabalho operacional, ainda que com algumas exceções. No segundo caso, registou-se uma disrupção significativa, quer na lógica do retalho alimentar, que ainda se está a adaptar, nomeadamente no canal online, quer na lógica do não alimentar, que é mais linear e tem sabido responder ao consumidor.
No contexto do desempenho económico, deixou uma questão aos oradores: “Poderá a Península Ibérica ser um porto de abrigo?”. A primeira resposta foi dada por Joaquim Vale, que exemplificou com a decisão do grupo Inditex de reverter todo o processo de produção, incorporando-o, com sucesso, na península. Na sua opinião, a Península Ibérica pode ser uma porta de entrada, mas ainda há um caminho a fazer em termos de ligações. Há que pensar as distâncias, os fluxos, os hubs. E isto porque “os fluxos logísticos são como a água, normalmente procuram o melhor caminho”.
Raul Sanchez corroborou esta mensagem relacionada com as infraestruturas, defendendo cinco ângulos. O primeiro prende-se com as ligações ferroviárias e a alta velocidade entre Lisboa e Madrid, que tem vindo a ser adiada. E que – defendeu – a União Europeia deveria assumir como prioridade. O segundo passa por reforçar a aposta nos portos, continuando a potenciar o seu crescimento, com investimento para que aumentem os volumes e a capacidade de internacionalizar a carga. Em terceiro lugar, criar corredores eficientes que liguem os portos aos centros de produção, de uma forma rápida. Como quarto ponto defendeu a criação de hubs de armazenamento, que permitam o fluxo de mercadorias entre os dois países, mas que também sejam um ponto de entrada e de saída para o resto do mundo. Finalmente, todos estes passos devem ser digitais e sustentáveis.
Christopher Corbin retomou o tópico da integração, para considerar que é um movimento inevitável, embora, em Espanha e em Portugal, ainda se assista a muita fragmentação. A seu ver, as grandes empresas multinacionais trabalham melhor, mas as médias empresas ainda apresentam muitos pontos cegos. Há, pois, espaço para a melhoria, o que envolve duas valências – a liderança e a tecnologia. Concordando com esta visão, Jan Schwietzke manifestou a opinião de que coincidem duas realidades a nível ibérico, com fornecedores logísticos a possuírem um armazém que serve os dois mercados, olhando para a península como una, enquanto outras empresas continuam a focar-se na gestão separada. Mas a necessidade de integração existe, como ficou comprovado com o interesse suscitado pela SCM Conference Iberia 2024.
Na integração, os dados são fundamentais. Isso mesmo defendeu o CEO da Santos & Vale, considerando-os “uma questão essencial”: “A comunicação dos dados é tanto ou mais importante do que a prestação de serviços. Se não conseguimos comunicar, se não conseguimos a integração de dados com os nossos parceiros, sejam fornecedores ou clientes, não temos negócio.” A concluir, deixou a nota de que, “no futuro, só haverá uma realidade – os que estão conectados e os que são infoexcluídos”. Quanto a quem deve assumir a responsabilidade da integração, o porta-voz da Sika considerou que os governos devem ajudar neste processo, simplificando as leis e promovendo projetos conjuntos, com uma visão de longo prazo. Em paralelo, comentou que eventos como a SCM Conference devem ser “uma ponta de lança” para colocar os temas em cima da mesa.
Mantendo o foco na logística ibérica, João Sousa, Executive Board Member dos CTT, apresentou a evolução da empresa e a expansão em Espanha. O responsável começou por apontar o desafio da transição de uma empresa cuja principal função era o correio físico, para o correio digital, fruto da natural evolução do mercado. Face a este desafio nasceu a oportunidade de se focar no negócio do correio expresso, que tem, atualmente, maior expressão do que o correio tradicional. A Península Ibérica é, hoje, o 4.º maior mercado de e-commerce da Europa, e 50% das empresas portuguesas têm Espanha como principal destino externo, enquanto 20 a 30% das empresas espanholas têm Portugal. Os CTT potencializaram este crescimento. Não ficou de fora a menção da aquisição da Cacesa e a parceria estratégica com a DHL para criar uma joint venture focada no comércio eletrónico na Península Ibérica. Os objetivos destas decisões passam por acelerar a liderança no e-commerce ibérico, diversificar o risco e atacar eficazmente o segmento internacional.