As entregas last-mile irão continuar a crescer com o e-commerce, sendo crítica a sua descarbonização em todo o ecossistema.

A adoção do e-commerce por uma fatia cada vez maior de consumidores tem levado ao crescimento exponencial dos serviços de entrega last-mile, contribuindo negativamente para a pegada ecológica desta indústria.

Em 2020, ainda num cenário pré pandemia, o Fórum Económico Mundial previa um aumento superior a 30% das emissões geradas pelas entregas last-mile até 2030 nas 100 cidades mundiais mais relevantes, tornando a sua descarbonização um tema pertinente.

A mudança mais imediata é a alteração da tipologia de veículo utilizados. A eletrificação das viaturas de entregas (cujas emissões são menos de metade das movidas a diesel) ou e-cargo bikes (que se prevê que poderiam substituir imediatamente cerca de 10% das viagens num centro urbano como Londres), o futuro passará igualmente por veículos autónomos, drones e droids, cuja adoção em massa requer alterações na legislação e testes mais avançados de segurança.

A eletrificação em massa dos veículos de distribuição é um dos principais obstáculos à descarbonização mais imediata das entregas last-mile. Os modelos existentes são limitados, existem frequentes ruturas de stock, a autonomia média ainda é insuficiente, e são necessárias adaptações às infraestruturas logísticas para permitir o carregamento elétrico. No entanto, estes obstáculos serão ultrapassados com a evolução natural da tecnologia e regulação no setor automóvel. Soluções inovadoras, tais como as estações de substituição de baterias, poderão acelerar este caminho, reduzindo o downtime dos veículos.

Adicionalmente, é necessário aliviar a pressão sobre o tráfego urbano, por exemplo através da implementação de modelos de entrega maioritariamente noturnos, vias especiais para circulação de veículos de entregas, e sistemas inteligentes de gestão dinâmica do estacionamento. Estas soluções contribuem para a redução do estacionamento em segunda fila, e para os momentos de paragem devido ao congestionamento.

Os próprios espaços urbanos podem contribuir para esta transição através da adaptação de infraestrutura existente. A reconversão parcial de parques de estacionamento subutilizados em micro centros de distribuição locais dedicados exclusivamente a uma área específica permitiria reduzir os tempos e extensão das redes de entregas, privilegiando meios alternativos e soft de entregas.

Por fim, o consumidor pode desempenhar um papel relevante. A rapidez de entrega é um fator crítico na decisão de mais de metade dos consumidores, mas esta flexibilidade tem um preço – de acordo com um estudo do MIT, as entregas rápidas aumentam os custos em cerca de 70% e levam a 15% de emissões poluentes adicionais. Assim, é importante incentivar escolhas mais sustentáveis junto do consumidor, tais como compras e devoluções conjuntas (bundling) ou a recolha de encomendas em cacifos próximos da zona de residência ou local de trabalho.

As soluções tecnológicas também poderão contribuir para reduzir as emissões poluentes da atividade logística, nomeadamente os algoritmos de previsão de procura, análise dos comportamentos dos condutores e otimização de rotas de entrega.

Existem diversas alternativas para acelerar a descarbonização das entregas last-mile, mas nem todas imediatas, e a sua implementação conjunta pode requerer uma profunda disrupção no setor no sentido da colaboração entre Municípios, Operadores e Consumidores.

Miguel Cardoso Pinto | Partner, Advanced Manufacturing and Mobility Leader | EY-Parthenon, Ernst & Young, S.A.

Miguel Poeira | Manager | EY-Parthenon, Ernst & Young, S.A.

Nota: O artigo foi primeiramente publicado no Jornal Económico, tendo os autores dado autorização para a republicação do mesmo.