Passamos de um ano para o outro com a Covid-19 a manter-se nas nossas vidas. E ainda que a gravidade da situação em termos de sobrecarga para o nosso SNS seja menor, a verdade é que nos vemos, como há um ano, em teletrabalho, dominados por receios e cuidados e com a atualidade dominada pelo vírus. Aliás, estranho será quando os indicadores sobre a evolução da doença deixarem de ser divulgados diariamente – por mim, passavam já a semanais, até porque os números diários são influenciados por várias realidades, como o simples facto de ser, ou não, fim de semana.

A meu ver, a bem de todos, os meios de comunicação social deveriam realçar ainda mais os baixos números de mortes e de pessoas internadas em unidades de cuidados de saúde, seguindo o exemplo do próprio Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa. Até porque, é verdade que a Linha SNS 24 está em sobrecarga, mas porque ainda não atualizámos a nossa estratégia à visível transformação da pandemia em endemia.

Como tenho escrito, é importante que cada vez mais comecemos a olhar para outras realidades que já nos começam a afetar. Lembram-se de há uns artigos eu advertir para uma provável crise económica à espreita? Pois bem, os seus efeitos já se sentem. Entramos em 2022 com o fantasma da inflação, explicada, em grande parte pela crise energética e pelas perturbações na oferta e na procura, e cuja influência no custo de vida é grave.

Os bancos centrais mundiais parecem impotentes para tomar medidas e o risco é a recessão. Eu, pelo menos, não me recordo de nenhum período de inflação, que não tenha sido seguido por recessão da economia. Dir-me-ão que, em 2021, as economias se aguentaram apesar da pandemia, mas eu lembro que isso aconteceu à custa de uma política de financiamento que, um dia, vai cair em cima de todo o mundo ocidental.

Num mundo globalizado como o nosso, já se sabe quem sofrerá mais. Os mais ricos continuarão a enriquecer, os mais pobres a empobrecer, aumentando ainda mais o fosso das desigualdades.

No setor da logística, os custos de distribuição aumentaram muito significativamente, respondendo à lei da procura e da oferta. Os armadores marítimos passaram de empresas em dificuldades para lucros sem precedentes.

É então que surge o velho dilema: não deveriam os Estados interferirem para impedir esta escalada de preços que já afeta os produtos que cada um tem nas suas casas? A questão é que, habitualmente, os Estados intervêm para não deixarem economias ou empresas com importância estratégica em dificuldades, mas parecem ter medo de o fazer em setores de atividade.

Nunca na história recente estivemos numa situação de inflação a subir em flecha e o custo do dinheiro em 0% para não falar em negativo.

Em Portugal, um país pequeno que segue as tendências económicas mundiais e dependente da Europa, teremos de olhar para uma política de prioridades. Há decisões que podemos ter em períodos expansionistas, mas que não podem ser consideradas quando temos de apertar o cinto.

Vejamos alguns exemplos que só contribuíram para nos fragilizar e nos tornar num país menos competitivo só porque os governos não decidiram quando lhes competia. Em mais de 30 anos, nenhum Governo foi capaz de tomar a decisão importante sobre a localização do novo aeroporto de Lisboa. É um assunto dramático em todos os aspetos, mas que agora deverá voltar a ficar na gaveta por mais uns anos, enquanto se tenta remediar a situação com a conversão de aeroportos militares, inadequados e mal situados.

Depois, temos de uma vez e para sempre tomar uma decisão realista sobre a TAP. Esta empresa vai comendo dinheiro com se fosse o pão nosso de cada, e como se não bastasse só serve Lisboa, porque cortou a maioria das escalas no Porto, onde se localiza uma parte importante da nossa economia.

Longe de mim negar a importância da TAP para a diáspora portuguesa. No entanto, devíamos agora estar empenhados nos desafios sociais que nos esperam em cenário de recessão, em vez de continuar a perder dinheiro a gerir empresas com administrações políticas sem qualquer conhecimento sobre o negócio.

A TAP não é prioridade, assim como não é continuar a financiar o Novo Banco.

A eficiência de uma boa rede de logística em todas as áreas é fundamental ao país. A rede de distribuição tem de ser rápida com custos competitivos. A importância do investimento na rede ferrovia continua a ser uma prioridade. Velocidade no movimento de passageiros de Lisboa para o Porto e de Lisboa para Faro, substituindo as linhas aéreas. Ainda mais importante é a movimentação das cargas dos portos para os destinos ou das origens para os portos.

Muito temos para fazer tanto no público como no privado. Atuar num clima de inflação não vai ser fácil, especialmente porque temos pouca experiência recente e porque as pessoas vão sentir no bolso, mas é o que nos espera em 2022.

Bruce Dawson, Presidente da Assembleia Geral | Grupo Garland