Durante o fórum anual do Banco Central Europeu (BCE), que ocorreu na passada terça-feira, reuniram-se especialistas como Jerome Powell, presidente da Reserva Federal (Fed) dos EUA, Andrew Bailey governador do Banco da Inglaterra, Haruhiko Kuroda governador do Banco do Japão e Christine Lagarde, presidente do Banco Central Europeu, para comentar sobre os impactos da crise sobre as cadeias de abastecimento.
Uma das conclusões da líder europeia foi que está a acontecer “uma fase inflaccionista temporária relacionada com a reabertura” da economia, e defendeu que “o principal desafio é garantir que não reagimos de forma exagerada a choques de oferta transitórios que não têm influência no médio prazo”, procurando “sair de forma segura da pandemia e fazer regressar a inflacção de forma sustentável, aos 2%”.
Alguns dos tópicos que estão a afectar as supply chains por todo o mundo também tiveram destaque durante a conferência, e Christine Lagarde disse que em áreas como a navegação ou os semicondutores os problemas “parecem estar a acelerar”, e que “é uma questão que estamos a acompanhar de perto”.
Jerome Powell, por sua vez, parecia admitir que a crise os tinha apanhado de surpresa, comentando que “o que as pessoas não previram foi a limitação da oferta” e que “não é que os nossos modelos de inflação estejam errados, apesar de não serem perfeitos, apenas ficaram esquecidos o alcance e a persistência das limitações da oferta”.
Embora os bancos centrais tenham alguma dificuldade em acompanhar a complexa evolução da economia, muitos desses problemas ficaram evidentes, por exemplo, na logística marítima, a partir do terceiro ou quarto trimestre do ano passado.
Os cinco maiores riscos que preocupam os banqueiros centrais são:
– Ruptura das redes de abastecimento, devido à grande procura dos consumidores, sem possibilidade de resposta por parte das empresas;
– Inflacção, que apesar de apontarem como sendo algo temporário, ficou claro que é um tema que os preocupa imenso;
– Falência do gigante Evergrande, que deixou todos os investidores preocupados, e que temem os impactos na restante economia;
– Ciberataques, enquanto um dos principais riscos financeiros, e que a presidente do BCE aponta que a longo prazo “pode levar a instabilidade financeira se ignorarmos completamente as consequências sobre o trabalho que é feito, sobre os activos detidos e na transição que planeamos daqui para a frente”;
– Moedas digitais, que poderão impactar o sistema financeiro, apesar de ainda não estarem a ser um dos problemas correntes.
Em declarações ao Financial Times relativamente à adopção de novas tecnologias combustíveis, Takeshi Hashimoto, CEO da Mitsui OSK Lines (MOL), comentou que os governos podem ter de intervir para “restaurar a ordem” e afirmou que “se for deixado inteiramente nas mãos da economia de mercado, determinadas empresas e indivíduos que fizerem todo o possível para encontrar a melhor solução para si mesmos levarão a um aumento cada vez maior e a uma situação fora de controlo”.
O facto de um CEO de uma empresa do sector privado defender a intervenção do Estado no mercado é um sinal de que os gestores logísticos estão preocupados com o rumo que o mercado marítimo está a tomar, sendo que as preocupações do CEO da MOL sobre o transporte marítimo envolvem tanto as taxas como a disponibilidade, e poderão ameaçar a viabilidade de muitas cadeias de abastecimento, tendo implicações para a economia global como um todo.
A responsável do BCE também referiu que o inquérito a analistas monetários “também aponta para uma convergência gradual da inflação”, que se prevê estabilizar nos 2% em cinco anos, e considerou que a pandemia causou uma recessão “muito incomum”, seguida de uma recuperação “muito atípica”.
A vertiginosa inflação das taxas de frete pela aparente escassez de contentores e espaços em navios não está em linha com o súbito aumento do comércio digital resultante da pandemia. Os mega armadores são subsidiados pelos respetivos e estados onde estão sediados pela frota acostada e pessoal em “lay off”, permitindo aos armadores mais valias milionárias com muito menos recursos adstritos. Por outro lado, os estados acumulam receitas extraordinárias pela coleta de taxas aduaneiras que incidem sobre o valor C&F (Custo e FRETE), frete esse que em média aumentou 11 a 18 vezes os seu valor médio. Um conluio de interesses pagos pelo contribuinte / consumidor através da crescente inflação real. Por outro lado, pelo preço a que os produtos chegam às prateleiras e pela instabilidade da cadeia de abastecimento, muitos países equacionam reactivar a produção local, o que se traduz em muito más notícias para a China que levou as últimas décadas a subsidiar a indústria nacional e a Exportacao, desmantelando por completo as indústrias mundiais. Resta-nos que a China lance mais dois ou três mega armadores e subsidie as taxas de frete para níveis competitivos por forma a relançar a sua exportação. Afinal, têm mais do que recursos para isso é mais.