Escassez de imóveis adequados poderá condicionar distribuição de comércio online nas grandes áreas metropolitanas.

A pandemia de Covid-19 veio aumentar o comércio eletrónico e evidenciar um consumidor cada vez mais exigente no que diz respeito ao serviço e à eficiência das suas compras online. Consequentemente, os retalhistas tradicionais e as plataformas de comércio eletrónico têm vindo a elevar o padrão para responder às expectativas dos consumidores. Para tal, têm sido realizados elevados investimentos em novas tecnologias e em sistemas eficazes de distribuição, de forma a aumentar a capacidade de manuseamento de encomendas, reduzir os tempos de entrega e assegurar que a encomenda é entregue ao consumidor final. Contudo, o sucesso da distribuição de encomendadas realizadas online está muito dependente da última etapa da cadeia de abastecimento, quando os produtos são entregues aos consumidores, designada como “last mile”.

Assim, o rápido crescimento do comércio online está a promover um aumento da procura por imóveis que respondam às necessidade da last mile dentro e ao redor das principais áreas metropolitanas, especialmente para armazéns de menor dimensão e mais eficientes, privilegiando áreas de logradouro capazes de acomodar vários veículos de entrega e situados em locais com boas acessibilidades que permitam acelerar o tempo de colocação de um pedido nas mãos do consumidor.

Nas grandes áreas metropolitanas, encontrar imóveis que beneficiem as operações dos ocupantes da logística de last mile em termos de mobilidade e eficiência é atualmente um desafio devido à escassez de terrenos cuja classificação urbanística do solo permita esse uso, restrições a operações logísticas, e acessibilidades e congestionamento do tráfego. Em diversas capitais europeias, têm vindo a ser exploradas diferentes alternativas de ativos, com localizações centrais, como o piso térreo de edifícios residenciais, a conversão de espaços de retalho (nomeadamente em stand alone), e a utilização de parques de estacionamento para parquear veículos.

A logística da última milha em locais urbanos centrais será fundamental para uma maior precisão, mas os ocupantes não vão necessariamente querer comprometer-se com arrendamentos de longo prazo. Algumas plataformas de comércio eletrónico e empresas de distribuição vão ainda procurar reforçar as suas operações, celebrando arrendamentos de curto prazo para aumentar a sua capacidade operacional nos períodos de pico como Natal e Black Friday. Este foco na flexibilidade e agilidade irá influenciar os requisitos da procura de espaço por parte dos ocupantes nos próximos anos.

Os imóveis de last mile vão ter menores dimensões, processar menos encomendas e servir menos pessoas, mas serão muitos mais.

 

Em Portugal, apesar do comércio online ainda não ter uma presença muito relevante – apenas 5% – assistiu um crescimento exponencial de 24% com a pandemia, de acordo com a Euromonitor. Consequentemente, diversas empresas de distribuição logística que já estavam a expandir antes do surto, aceleraram a procura de espaços junto de diversas zonas urbanas do País, nomeadamente com o desenvolvimento de projetos à medida. Também no setor do retalho alimentar já muitas empresas tinham em curso processos de otimização e adaptação ao comércio online.

A existência de uma malha industrial em redor das principais áreas metropolitanas, onde prevalecem diversas unidades fabris obsoletas, tem despertado o interesse de diversos investidores, promotores e ocupantes para a reconversão das mesmas para logística de last mile estando alguns projetos atualmente em curso.

Na zona urbana de Lisboa, localizações com um cariz histórico industrial onde predominam diversos armazéns e fábricas antigos, como o Beato e o Prior Velho no centro da cidade, assim como os eixos CRIL/IC17 e IC19 na envolvente, são onde incide a procura de imóveis para a last mile. No Porto, é a zona em redor do aeroporto, nomeadamente Maia e Matosinhos, que mais se destaca, embora nestas localizações a oferta seja escassa.

A sensibilidade em torno da rentabilidade do modelo de logística urbana e a escassez de imóveis industriais urbanos irá acentuar-se e impulsionar uma maior cooperação entre ocupantes, promotores e investidores.

Nuno Pereira da Silva | director de advisory & transaction industrial e logística da CBRE Portugal