Apesar dos maiores custos e burocracias associados à saída do Reino Unido da União Europeia, as empresas exportadoras portuguesas adaptaram-se a esta nova realidade e a aguentar os impactos do Brexit, e após um mês desde que o Brexit foi posto em prática estas já sentiram os impactos, mas não tão aguçados como esperavam vindo do quarto maior país para onde o nosso país exporta.
Desde os sectores do calçado, têxtil, indústria alimentar ou tecido português, várias foram as empresas que se manifestaram relativamente a um dos temas da actualidade, avança o ECO.
Fátima Oliveira, accionista da Mariano Shoes, conta que “o Brexit tornou o processo mais complicado e foi necessário adaptar as propostas para o mercado inglês”. Por causa desta mudança de um país importante para a marca de sapatos de luxo, a marca teve de se adaptar, e “alguns produtos deixaram de ser disponibilizados para o Reino Unido”. Foi ainda “necessário rever a forma como os nossos preços estavam a ser apresentados. Tentamos que o consumidor final não fosse penalizado com incremento de custos”, explica a responsável.
Do lado da indústria alimentar, Amândio Santos, administrador da Primor, comenta que “exportar para o Reino Unido tornou-se mais exigente”, porque “somos uma empresa que exporta produtos frescos, com validades muito curtas, o tempo de trânsito tem de ser bem cumprido. O risco de constrangimento do transporte pode pôr em causa o cumprimento dos requisitos do cliente ao chegar ao destino”.
Mas o inverso também ocorre, e muitas empresas britânicas também se queixam da forma como as suas cadeias de distribuição foram afectadas pelo maior aumento de sempre nos tempos de entrega de encomendas, segundo os dados do indicador Purchasing Managers Index (PMI) da IHS Markit.
Existem, no entanto, diferenças, e nem todas as empresas estão a ser afectadas da mesma maneira. Amit Manilal, business development manager da Bi-Silque no UK, Ireland & MiddleEast da Bi-Silque, fabricante de comunicação visual que exporta cerca de 20% da produção para o Reino Unido, revela ao ECO que “o Brexit não alterou de forma substancial a estrutura da empresa” e que as encomendas têm sido entregues com normalidade. “Passado quase um mês, mantivemos o volume de encomendas dos anos anteriores e estas têm sido entregues sem grandes constrangimentos”, destaca ainda, acrescentando que este país é o segundo maior mercado da empresa, depois dos EUA.
Meses antes da decisão final, em Outubro, já a Direcção Geral das Actividades Económicas (DGAE) alertava as empresas nacionais que a partir de 1 de Janeiro, devido ao aumento dos controlos aduaneiros, os custos para as empresas seriam mais elevados, no que toca, por exemplo, ao desalfandegamento, armazenagem, preparação de documentação ou cumprimento das conformidades, e que os prazos de entrega nas cadeias de abastecimento seriam mais longos, implicando alterações significativas na organização dessas cadeias.
Recorde-se que ficou acordado que não haveria taxas adicionais aplicadas à troca de produtos, no entanto, é necessária a documentação extra, e as empresas sentem dificuldades acrescidas, pelo que as entrevistadas afirmam que se tornou mais caro exportar. “Se assumirmos o aumento da papelada (custos administrativos) como um custo acrescido relevante, nesse caso, teremos de admitir que ficou, de facto, mais caro exportar para o Reino Unido”, afirma Amit Manilal, acrescentando que “estabelecemos parcerias locais que nos facilitam o processo aduaneiro”.
Teófilo Leite, presidente da ICC – Indústria de Comércio de Calçado, detentora da marca Lavoro, empresa de calçado de segurança que exporta cerca de 15% da sua produção para este país, confirma que se tornou “mais caro exportar para o Reino Unido” e que isso se vai reflectir nos preços do importador.
Também o administrador da Primor se queixa que o aumento da burocracia aumentou os custos de todo o processo, e suporta a ideia de que “é mais caro exportar para o Reino Unido logo a começar pelos processos internos. Hoje temos uma maior carga administrativa e é preciso alocar recursos para a cumprir”.
Embora estejam a sentir o impacto, tanto a Mariano Shoes e a Bi-Silque decidiram não aumentar os preços dos seus produtos, e o responsável desta última afirma que “optámos por internalizar esse ónus e não aumentar os preços, para que possamos continuar competitivos a todos os níveis, pois concorremos no mesmo mercado com empresas que produzem no Reino Unido, Europa, mas também no extremo Oriente”.
A indústria têxtil, por sua vez, está a conseguir contornar a situação e não apresenta grandes dificuldades até ao momento. Luís Guimarães, presidente da Polopiqué, empresa líder na indústria têxtil de vestuário, admite “não estar a sentir dificuldades adjacentes ao Brexit”, mas sim crescimentos. Só no mês de Janeiro, a empresa já facturou meio milhão de euros, apenas neste mercado, para o qual exportou, no ano passado, 5% da sua produção, mas que ambiciona chegar aos dois dígitos até ao final do ano.
Também a Bosch não está a sentir tanto o impacto do Brexit, mas sim da falta de componentes eléctricos no mercado, “isso é que nos está a prejudicar, a nós e aos nossos clientes”, afirma Carlos Ribas, o representante da empresa em Portugal.
A última declaração ao Eco foi por parte da Vista Alegre, e Paulo Soares, administrador da empresa, também não se encontra a sentir estas dificuldades maiores e que “as vendas processam-se de forma regular”, mas admite que sente o peso da carga burocrática.