Após uma longa negociação desde a sua saída oficial da União Europeia (UE) a 31 de Janeiro de 2020, o Reino Unido chegou finalmente a um acordo comercial com a UE que iriam impactar tanto as pessoas e as empresas do Reino Unido como de fora do país. Até dia 31 de Dezembro de 2020 tinha de haver um acordo entre as partes, e desde trocas comerciais, taxas de importação de produtos, movimentação de pessoas, zonas piscatórias, regulamentações concorrenciais, serviços financeiros… muitos foram os tópicos em debate após a saída da potência da UE, ao longo de cerca de 10 meses.

Por toda a Europa, empresas que exportavam para o Reino Unido procuraram reforçar os seus stocks o máximo possível dentro do país para conseguirem continuar a abastecer o país evitando algumas hipotéticas tarifas aduaneiras. A possibilidade de acontecer resultou numa grande movimentação de produtos para o país, aumentou a procura por armazéns no Reino Unido e procura por fornecedores alternativos de modo a que as empresas se conseguissem abastecer sem custos adicionais. No entanto, apesar do receio e das precauções, acabou por correr tudo bem… Mas nem todos estão contentes.

As trocas de bens foram a temática principal, e relativamente a isso ficou acordado que os produtos trocados entre os países-membros e o Reino Unido estavam isentos de tarifas aduaneiras. O que caso não tivesse acontecido, para além de terem custos muito elevados, também estavam sujeitos a alfândega, um problema especialmente para o transporte de produtos frescos e com curto prazo de consumo. No entanto, continua a haver algumas mudanças.

Nalguns casos existirão barreiras regulatórias, tendo em conta, por exemplo, as regras de origem, uma certificação do Reino Unido tendo em conta a origem das suas exportações para o espaço comunitário, e poderão ser aplicadas novas taxas alfandegárias nos casos de bens que ultrapassem o limite de 40% à incorporação de componentes oriundos de países terceiros ao Reino Unido para o respectivo fabrico. Londres também conseguiu que os componentes vindos da UE contassem como “Made in Britain”.

O estipulado entre Londres e Bruxelas é que se tente minimizar ao máximo os custos alfandegários para as empresas.

Mas sem um acordo de reconhecimento mútuo é possível que as entidades reguladoras britânicas nem sempre consigam certificar produtos para serem vendidos na UE, e isso poderá criar entraves na negociação entre países.

Ao nível da segurança e da saúde, os exportadores de bens alimentares do Reino Unido vão necessitar de uma certificação sanitária e controles fito-sanitários nos postos fronteiriços.

Em caso de litígio, tanto o Reino Unido como a UE poderão aplicar sansões comerciais, conforme o estipulado nas regras da Organização Mundial do Comércio (OMC). No entanto, apesar de se aplicarem estas regras aos produtos, ao nível dos serviços, quem regula é a OMC.

Ao nível das regras concorrenciais, Bruxelas exigiu que o Reino Unido mantivesse padrões idênticos ao nível laboral, ambiental, social e fiscal, de forma a que não existam vantagens competitivas entre as partes, o chamado “level playing field” e um dos maiores obstáculos da negociação. No entanto, não está prevista uma forma de vincular o Reino Unido a acompanhar a evolução das regras do mercado único europeu, mas novamente a possibilidade de ambas as partes aplicarem sanções caso o outro se afaste do acordado.

Para o sector dos transportes, ficou assegurada a movimentação aérea, rodoviária marítima e ferroviária, sendo que haverá mudanças para os camiões de carga de longo curso, e ambas as partes se comprometem a fazer uma gestão eficaz dos controles de vistos e fronteiriços, sobretudo na fronteira entre o Reino Unido e a UE. Relativamente à movimentação de produtos aeroespaciais produzidos na UE, estes deixam de estar automaticamente reconhecidos, criando uma desvantagem para o Reino Unido.

Os camiões de longo curso vindos do Reino Unido passam também a deixar de poder fazer três paragens nos países da UE, passando a poder fazer apenas uma.

No que toca à lei das pescas, houve alguma controvérsia, tendo sido uma das partes mais difíceis na negociação. Ficou acordado entre as partes que até Junho de 2026 haveria um período de transição, sendo que os países da UE poderão pescar na costa britânica até essa data. Por parte dos pescadores do Reino Unido gerou-se uma revolta, pois pensavam que fosse ficar estabelecido que eles teriam a exclusividade do uso da costa, ou sequer o uso exclusivo de 12 milhas para barcos britânicos.

A 1 de Janeiro, foram concedidas 1500 “licenças provisórias” aos navios de pesca europeus para entrar na Zona Económica Exclusiva (ZEE) do Reino Unido. Neste período de transição, a UE aceitou um corte de 25% à respectiva quota pesqueira nas águas territoriais britânicas, um valor bastante inferior aos 80% inicialmente propostos pelo Reino Unido. A UE assegurou ainda o direito de adoptar medidas de retaliação caso Londres não permita o acesso previsto às suas águas.