No momento em que escrevo esta minha primeira contribuição para a Supply Chain Magazine, o país e o mundo vivem um momento de crise não previsto e que tem vindo a criar um panorama de exceção na vida das pessoas e das empresas. Na História Mundial, já tivemos mais de 10 pandemias e, se somarmos a estas, as crises financeiras e as catástrofes naturais, chegamos à conclusão que, desde sempre, a Humanidade viveu épocas desafiantes. Encontrar nelas uma oportunidade para crescer é o segredo das empresas mais sólidas.

Esta será mais uma crise como tantas que já vivemos e também ela será ultrapassada com boa gestão, boas ideias e planos para fazer crescer o negócio mesmo em período desfavorável. Só a título exemplificativo, a Garland aproveitou momentos como a II Guerra Mundial, o 25 de abril ou a crise financeira de 2008 para se lançar em novos negócios. Foi com o primeiro que iniciámos a atividade transitária, com o segundo lançámo-nos no transporte de mobílias das ex-colónias portuguesas para Portugal na grande fuga dos Retornados para o seu país de origem, e foi no terceiro momento que arriscámos no desenvolvimento da Logística, com a construção de novos Centros Logísticos, quando ainda não tínhamos clientes em carteira para os preencher. Todos eles representaram riscos para a empresa; mas resultaram da análise do mercado e das condições de cada momento para encetar caminhos que nos permitisse recuperar da normal redução de atividade em cada crise.

Investir num momento de crise pode levar a que, quando o negócio expande, as empresas já estejam adiantadas nesse propósito, potenciando assim o seu crescimento, ao passo que investimentos em alturas de expansão podem resultar em dificuldades para concluir esse investimento quando, à expansão, se segue um período desfavorável. O que quase sempre acontece.

Mas a pandemia não é a única crise que vivemos no setor de Transporte e Logística. Num momento que é difícil para todos, dura há meses uma nova greve no porto de Lisboa. O que até já nem surpreende: em mais de 50 anos de vida profissional, não me recordo de um período longo de paz social neste porto. Atualmente, os estivadores experientes, mas altamente militantes sindicais, foram substituídos por outros mais jovens, mas sem qualquer experiência, o que traz consequências aos níveis de produtividade e segurança. Os armadores, esses, continuam a abandonar o porto da capital, até aqueles que, apesar dos problemas, se mantinham fiéis à plataforma portuária.

Acredito que só com a intervenção do Governo e das autoridades se conseguirá pôr cobro a estas crises constantes no porto de Lisboa, os quais duram há mais de quarenta anos. Numa altura, em que urge relançar as economias mundiais, um porto de Lisboa forte e sólido é uma condição essencial para Portugal, até porque o porto de Setúbal, que tem sido a alternativa, está já nos limites da sua capacidade.

Condição essencial para recuperar a economia nacional é também uma maior aposta na ferrovia, que há muito deveria ser uma área prioritária, mas à qual tem faltado um plano estratégico, ficando o seu desenvolvimento dependente dos ciclos políticos. Foi ainda durante o regime do Estado Novo que se investiu no porto de Sines, um porto magnífico de águas profundas, destinado a ser um terminal petrolífero. Mais de 30 anos se passaram até que um Governo Português decidisse investir num terminal de contentores. Estamos em 2020 e ainda não temos uma rede completa de transportes rápidos de ferrovia do porto para o Interior do país e para a Espanha. A consequência é que os navios vindos de várias zonas do mundo, que poderiam escalar Sines, acabam por ir para Barcelona, Valência e Algeciras. Portugal tem, assim, deixado escapar todas as oportunidades de investir numa rede de comunicação que promova Sines a mais que um porto de transbordo. Aliás, o porto é apenas um exemplo do pouco investimento sustentado que se tem verificado em infraestruturas necessárias à economia do país.

Bruce Dawson, Chairman |Grupo Garland