Atualmente vivemos “tempos” atípicos, nomeadamente o confinamento social, estando este a ser respeitado com responsabilidade e firmeza pela sociedade civil. Acabamos por ter mais tempo para refletir em soluções para um futuro próximo, quando tudo parece estar mais evoluído tecnologicamente, sendo o teletrabalho é uma boa solução para que algumas atividades não parem. Mas, quando retomarmos a atividade “normal” dentro das condições que poderemos vir a ter, muitas coisas serão diferentes, bastantes serão alteradas e substituídas e/ou mesmo reinventadas.

Nas operações logísticas de cargas, descargas, transporte, expedição, receção, manuseamento de mercadorias e armazenagem; existem sempre demasiados contactos físicos entre os operadores e mesmo quando são utilizados sistemas automatizados, os contactos são frequentes e regulares.

Relativamente às operações internas terão um tratamento mais controlado, tendo obrigatoriamente de existir algumas alterações de hábitos e de regras, mas será mais fácil controlar e regulamentar. No entanto, nas operações externas ou naquelas em que tem obrigatoriamente de existir contacto há uma grande oportunidade para reinventar soluções.

Então, quais serão efetivamente as maiores dificuldades das operações?

  • Uso de EPI’s sociais, não estamos habituados a usar, poucos tem a consciência das dificuldades do uso obrigatório de máscara, luvas e viseiras;
  • Garantir o afastamento social quando somos naturalmente um povo de afetos, os cumprimentos e os “diálogos” normais na atividade e no dia-a-dia, são hábitos difíceis de eliminar;
  • Os comprovativos de entrega, sendo que na atual situação estão a ser entregues as mercadorias sem a assinatura do recetor, é uma boa opção quando a atividade está moderada, mas quando a atividade aumentar vão aumentar também as probabilidades dos riscos de danos e os recorrentes processos de indemnizações;
  • A documentação que acompanha a mercadoria continua a ser obrigatória e necessária para dar continuidade ao fluxo físico.

Os mais otimistas pensam que vamos melhorar de forma substancial o uso das ferramentas tecnológicas para reduzir o uso de papel, os famosos Flow e Flow-II (digitalização de processos). Acredito também, que uma das principais soluções é efetivamente a implementação de sistemas informáticos de controlo documental. Por isso penso que os desafios que enfrentamos nas operações no futuro bem próximo são:

  • Reduzir a necessidade da utilização do papel, na ótica dos empresários será investir em sistemas que potenciem a formação dos colaboradores para que deixem de ter necessidade do papel físico para execução do trabalho. Na ótica do controlo legal, é necessário que todos tenham a possibilidade de executar documentos virtuais, sendo um grande desafio para o governo e para as forças de segurança. Por fim, e não menos importante é a necessidade que as seguradoras alterem os requisitos de acesso à indemnização e todos os comprovativos físicos necessários.
  • Criar novas metodologias, tais como as rotas, deverá pensar-se em reduzir ao máximo o contacto nas plataformas logísticas, por exemplo criar plataformas avançadas. Esta medida vai ao mesmo tempo reduzir os contactos e tenderá a reduzir o custo de transporte e de operação de descarga.
  • Deverá ser criada uma entidade reguladora de controlo de capacidade de carga, isto é, os equipamentos que não forem completos deverão ser controlados por forma a tentar criar eficiência nas operações de transporte. No mundo ideal bastaria termos os sistemas a funcionar na otimização máxima, os detalhes da carga versus a capacidade do equipamento, e só teria ordem de saída após esta certificação.

Preocupa-me em particular a adaptação das micro e pequenas empresas que operam neste setor (podemos obviamente alargar a todos os setores, devido à problemática ser idêntica), sendo que em casos mais específicos será mais difícil de ultrapassar. No setor da logística, principalmente nas pequenas empresas de transportes que realizam em outsourcing serviços para os grandes operadores, que têm vindo a sobreviver à custa da pressão sobre o custo mínimo na operação, refiro-me às condições de muitos motoristas e estafetas que realizam mais de 300 stops diários com ordenados mensais inferiores a 800€, acreditem que existem bastantes! Estas pequenas empresas com empresários que muitas vezes também são os motoristas vão conseguir adaptar-se? Como sabemos existem grandes dificuldades em ter serviços eficientes de entrega na última milha, aparecem agora alguns operadores especializados para resolver essas dificuldades, principalmente nos grandes centros. E nas restantes regiões onde os operadores são pessoas de idades já avançadas e/ou com pouca escolaridade, com diversas dificuldades em compreender processos simples de entrega/descarga que em grande percentagem quando algum incidente acontece não existe sequer um comprovativo de entrega ou uma assinatura visível?

São muitos destes que vão ter de utilizar terminais digitais, controlar as cargas através de sistemas de codificação (códigos de barras, QR, RFID, etc.), por forma a garantir o rastreamento e confirmação da validação de entrega/receção por parte do cliente.

As associações empresariais, centros de formação, entidades reguladoras e fiscalizadoras vão ter de desenvolver planos estruturados de implementação destas regras e medidas de segurança social. Não basta dizer que temos de usar os EPI’s e que é necessário o afastamento social, todos nós sabemos o que isso é, o que representa na execução das nossas tarefas habituais é o que ainda vamos descobrir!

Rui Silva | Co-founder | COPLOG – Consultores em Operações de Produção e Logística