Ao observarmos o comportamento do consumidor nas suas compras nos primeiros dias desta crise pandémica e ao assistirmos à capacidade das cadeias na normalização dos abastecimentos, fica demonstrado a Resiliência de cada uma das redes logísticas da Distribuição Alimentar presente em Portugal.

O desafio em manter a cadeia de abastecimento em funcionamento, é um dos pilares desta Resiliência que implica em primeiro lugar uma abordagem única na Gestão dos Recursos Humanos, que poderá passar por algumas decisões-chave:

• Identificação na cadeia logística de quais são as “funções essenciais” neste período de crise e definição de um “trigger-point” para desativar as “não essenciais”. Ou seja, quais são as funções prioritárias da operação e quais os processos subjacentes que podem ser aligeirados? Por exemplo, deverão ser postos em prática procedimentos de receção e expedição simplificados nas lojas e armazéns, para reduzir o contato entre funcionários e motoristas (nacionais e transporte internacional);

• O teletrabalho é certamente uma importante alternativa e tem seguramente oportunidades de aplicação na operação logística. Como exemplo, a área de Aprovisionamento na ótica de reposição de stocks terá enquadramento neste formato. Muitos dos processos das encomendas aos fornecedores, assentam em sistemas que têm informação on-line dos níveis de stock por artigo em cada centro logístico e procedem à “sugestão” de quantidades a encomendar, tendo em conta vários fatores parametrizados. O contato diário entre os aprovisionadores, os fornecedores e armazéns da empresa, é na maior parte dos casos feito via comunicação eletrónica ou telefónica;

• As bases logísticas dos grandes operadores do retalho, dispõem de uma força laboral que em alguns casos é formada por centenas de colaboradores em vários turnos de trabalho. Neste sentido, será uma ajuda importante o desenho de políticas de afixação e formação de Medidas de Proteção Individual, como práticas de higienização e novas medidas de contato social. Os momentos de início e fim de turno em cada uma das áreas dos armazéns, as trocas de equipamento rolante, o uso dos meios biométricos de controlo de horários, merecem especial reflexão e revisão de procedimentos;

• Especial preocupação da empresa face aos colaboradores e respetivos familiares afetados e como tal, necessidade de implementar sistema de informação interno que permita o follow-up destes casos.

Dos vários pontos que poderão ajudar a “aligeirar” de forma estratégica a cadeia logística nesta crise, será certamente a definição dum sortido básico, identificando-se as categorias e artigos essenciais que se deverão manter em níveis de stock apropriados nas várias lojas da cadeia, durante esta fase. Nas nossas listas de compras, todos nós já estabelecemos os artigos prioritários (as já célebres categorias de derivados de papel, enlatados, itens primordiais nas secções doce e salgada, artigos de limpeza, congelados e perecíveis). Esta redefinição temporária do Sortido neste momento de crise, terá certamente efeitos comerciais e de margem, mas poderá contrabalançar o esforço laboral nos centros logísticos e lojas e nos fluxos de mercadoria da cadeia.

Outro ponto do Plano de Contingência que poderá ser adotado, porventura numa fase mais prolongada da crise, será a identificação dum conjunto de lojas prioritárias ou estratégicas da cadeia, assumindo-se o fecho de lojas próximas de menor venda; esta decisão, levará a uma concentração de meios (pessoal, stock e distribuição) para este conjunto de lojas.

Vários tópicos podem também ser repensados em todo este desenvolvimento: a exposição massiva de produtos críticos no layout de lojas, a proteção individual do pessoal de lojas, a gestão de fila em checkout, as formas de pagamento, o transporte de pessoal, a informação interna e seguramente muitos outros.

Em Portugal ainda estamos porventura longe do final desta crise, que seguramente a nossa sociedade ultrapassará e como tal, ainda não é o momento de projetarmos as transformações que o Retalho e a sua Logística irão desenvolver na fase pós-crise. Ficará para um próximo artigo.

Manuel José Gomes
Consultoria Logística e distribuição