Temos assistido desde abril e com especial destaque nas últimas semanas às mais variadas análises e discussões sobre a estrutura remuneratória dos motoristas de pesados e do dia de trabalho destes profissionais.

Nesta reflexão, irei abstrair-me dos vários aspetos presentes nesta discussão e colocar o foco desta problemática em algumas áreas da cadeia de abastecimento do retalho (com elevados níveis de centralização logística), que tem como principais pilares o TRANSPORTE, na vertente de Transporte Primário (gerido em muitos casos por operadores logísticos) e no transporte secundário (assente na contratação de empresas do setor, para o abastecimento à rede de lojas, desde os centros logísticos).

Um dos tópicos desta análise é o impacto que a natural evolução salarial dos motoristas terá, ao repercutir-se na estrutura de custos logísticos e que possíveis formas podem ser desenvolvidas para ajudar a contrabalançar este incremento. Para uma perceção rápida, uma evolução de 100€ na estrutura de custos de transporte para um total de 200 a 300 viaturas (dimensão média da frota total ao serviço dos principais grupos de retalho que operam em Portugal), irá representar um acréscimo entre 240K € e 360K € ano, que terá um impacto considerável no objetivo de manter o custo logístico total em redor dos cinco  pontos percentuais sobre as vendas.

Neste contexto, a logística deve desenvolver projetos sustentados de poupanças operacionais, com uma visão diferente do tradicional corte de custos, mas assentes na “reengenharia” de processos, formas alternativas de operar, que possam conduzir a um custo operativo menor. Alguns possíveis exemplos de áreas de oportunidade e análise:

o Fluxos primários, tendo em conta as diferentes opções de camião completo ou compartido, milk run e transferências de stock entre centros;

o Modelo de controlo de custos em open book com as empresas de transporte secundário, para uma gestão mais clara e eficaz dos mesmos;

o Contratos com as empresas de transporte, que possam ir além da mera prestação de serviços, e que configurem gestão partilhada da operação;

o Serviço da frota em regime de frota exclusivamente dedicada versus contratação ao frete;

o Sistemas de planeamento de rotas e de logística inversa;

o Planos de abastecimento às lojas, tendo em conta diferentes frequências de entrega das secções de Perecíveis, Frio e Seco;

o Plataformas logísticas regionais para processos de cross-docking.

Uma outra área de reflexão da operação logística e que tem impacto no dia de trabalho dos Motoristas, é a gestão da receção dos centros de distribuição e do KPI do tempo de espera para descarga (análise similar deve ser feita para as zonas de expedição e cargas). Nesta vertente, o fluxo de entrada está muito ligado a alguns aspetos de gestão desta área, que destaco:

o Métodos de conferência de mercadoria, em que devem ser adotados os sistemas de leitura ótica de etiquetas eletrónicas hoje no mercado, cuja implementação massiva é muito influenciada pela estreita colaboração entre Fornecedor e Distribuidor;

o Correta gestão de horários;

o Fluxo de entrada das paletes da placa de receção para o interior do centro (zonas de reserva ou fluxo tenso e eficiente gestão de estanteria através de sistemas WMS apropriados);

o Correto dimensionamento e localização das áreas de Receção, Picking, PBL, Reservas, etc.;

o Eficiente fluxo administrativo e documentação.

Estes tópicos entre outros, em conjunto com as condições das salas de espera, irão certamente ajudar a reduzir esta componente do tempo de espera, sendo esta também um contributo da operação logística do retalho, para melhor enquadrar esta problemática.

Manuel José Gomes, Consultoria Logística e Distribuição