O Auditório Infante D. Henrique da APDL, em Leça da Palmeira, reuniu no dia 22 de fevereiro mais de uma centena de profissionais de compras e procurement, com um simples propósito: Transformar a gestão de compras e o procurement. A missão de partilhar os seus pontos de vista, experiências e perspetivas sobre o tema esteve a cargo de 12 inspirados e inspiradores oradores que deixaram à assistência algumas sementes de potenciais mudanças para a profissão.

Ao longo de meio dia, os profissionais olharam para o setor, a evolução que tem tido, as tendências e… A humanização da profissão. Foi precisamente por aí que Isabel Paiva de Sousa, consultora em gestão de pessoas, iniciou a tarde de conferências, com o tema “Competências estratégicas do Negociador: porquê e para quê? Da preparação à criação de valor”. Olhando para a própria natureza humana, defende que “desde que nascemos que negociamos”, desde o simples choro de criança com a intenção de obter algo.

Na própria negociação, Isabel Paiva de Sousa destaca existirem diversas formas e níveis de negociação. Negociamos com empresas, parceiros, equipas, fornecedores ou clientes, mas também com recursos humanos, com a board ou com o marketing. Existem negociações internas e externas, e com intenções diferentes. “Sempre que queremos implementar um novo processo, outra campanha, etc., estamos a negociar”.

Por outro lado, desmistifica a ideia de que a colaboração não faz parte da nossa essência, o que é visível nos comportamentos naturais das crianças. É uma característica que desenvolvemos com o tempo e com a vida em sociedade. “Nós somos competitivos, e aprendemos a ser colaborativos”, afirma.

 

Seguidamente, Wolfgang Rueth, Head of Efficio Hub Portugal, e Pedro Barroso, diretor da Efficio, olharam para as tendências atuais em diferentes áreas. Com o tema “Inovar em Procurement com a Efficio: Tendências atuais nas categorias de Food, Logística e Metais”, a intervenção da Efficio analisou a evolução do mercado e como será o futuro.

Se a pandemia já tinha sido um momento de renovação da profissão, questões como as tensões geopolíticas entre a Rússia e a Ucrânia, baixa demanda global devido a fatores adversos macroeconómicos ou mudanças climáticas adversas extremas, foram alguns dos temas destacados pelos profissionais. Assim, deixaram alguns pensamentos no ar: o que irá voltar ao que era? O que irá permanecer? E do que aprendemos, o que será replicável para o futuro e que práticas deixarão de existir?

“A questão que eu acho que nós temos de colocar como profissionais de procurement é se naquilo que aprendemos, e naquilo que foi diferente nestes dois anos, se há aqui algumas questões que nós podemos adquirir e que podemos manter, para aquilo que é o futuro de procurement”, afirmou Pedro Barroso.

 

Sandra Tavares Magalhães, Lawyer da Miranda & Associados, deu um enquadramento legal da contratação pública sustentável e da sua finalidade através do tema “Compras públicas sustentáveis: como envolver o mercado?”.

Ao nível do envolvimento do mercado, o processo que tem lugar antes da aquisição, destacou algumas práticas que podem e devem ser feitas antes da abertura de um contrato público, como é o caso de uma consulta preliminar ao mercado. “O envolvimento do mercado trata-se de um processo que tem lugar antes de um procedimento de contratação pública ser lançado, antes da aquisição ser concretizada que, em bom rigor, também ocorre durante e após o processo”, nota a responsável. “O objetivo é, desde logo, permitir à entidade pública, o mercado, o que é que pretende, qual é que é o seu objetivo, quais são as suas necessidades. Por outro lado, também lhe permite identificar logo potenciais fornecedores, em certos produtos, soluções que eventualmente lhes possam interessar”.

Sandra Tavares Magalhães destaca, no entanto, que a consulta preliminar não pode ter por efeito distorcer a concorrência ou resultar em qualquer violação dos princípios da não discriminação e da transparência, “ou seja, a consulta preliminar não pode ser utilizada para distorcer ou desvirtuar a concorrência, os resultados da consulta não podem servir para conferir uma vantagem desleal a nenhum dos operadores económicos que nela tenham participado e devem ser tomadas medidas que garantam a integridade, por exemplo, que a mesma informação seja facultada a todos os operadores económicos que nela participem”.

A responsável apontou algumas formas de preparação para o envolvimento do mercado, métodos para o envolver e abordou ainda a temática de gestão de risco.

 

De seguida, Fernando Belém, Chefe da Divisão de Aprovisionamento, Lipor, apresentou o tema “Central de compras da Lipor – um caso de sucesso”, onde não só deu a conhecer como funciona a central de compras já conta com mais de 40 anos de existência e é composta por 8 municípios da região do Grande Porto, sendo que também aderiram algumas entidades, totalizando 16 membros.

Ao consolidarem numa única negociação os diferentes processos, a Lipor consegue obter vantagens ao nível da economia de escala, diminuição de custos administrativos e permite a troca de ideias entre os elementos da central de compras.

A central de compras conta com contratos de fornecimento de energia 100% renovável, combustíveis rodoviários (compensação carbónica), gás natural e comprimido, subscrição de apólices de seguro, prestação de serviços de segurança, higiene e saúde no trabalho e, mais recentemente, também prestação de serviços de manutenção de espaços verdes, de iluminação interior e exterior com análise do custo de ciclo de vida, e de serviços de viagem e estadias. Estão ainda a avançar com um processo de Aquisição de Fardamento / Vestuário Têxtil, no qual entrou em maior detalhe durante a sua apresentação.

 

André Vaz Silva, Head of sales da WTW, foi o próximo interveniente a pisar o palco, olhando para os “Desafios do procurement na negociação de seguros”, e para um dos temas constantes dos profissionais de procurement: o risco.

O responsável explicou como funciona a contratação de seguros, os diversos tipos de contratação de seguros, e a sua volatilidade face às adversidades, mas também a importância de manter uma apólice que garante uma maior segurança no caso de ocorrer alguma eventualidade, o que tem sido cada vez mais comum no setor da logística.

“As seguradoras transferem o risco para os grandes resseguradores e se o preço que as seguradoras pagam aos resseguradores está mais alto, isso vai-se refletir nos vossos prémios. Por outro lado, questões de regularização de sinistros, se há uns anos reparar um pequeno sinistro numa habitação era uma coisa relativamente simples, hoje custa o dobro. Tudo isto tem impacto no resultado das apólices, e consecutivamente nos prémios”, explica.

O responsável da WTW destacou ainda os diferentes tipos de seguros e de contratação, e as suas vantagens e desvantagens para fazer face aos momentos de “hard market”.

 

Quase a terminar, Vítor Ribeiro Gomes, CEO da Pendular, Ana Moirinho Barbosa, Head of Procurement da High Gate, Luís Vasconcelos, Diretor de Compras da Comp-RAR – Central de Compras, e Ricardo Filipe Teixeira, Procurement Director da Anteros Empreitadas, integraram uma mesa-redonda moderada por Miguel Silva, CEO / Senior Partner da ADMICAMI. O desafio deste painel foi abordar o tema da conferência: “Missão: Transformar a gestão de compras e o procurement”.

Os oradores abordaram importantes temáticas que foram desde a responsabilidade social e empresarial, a importância da tecnologia e mesmo como podem as empresas tirar proveito da “desorganização”, de modo a reverem os processos e as reais necessidades internas, mas um dos mais realçados foi a importância de separar as funções em departamentos diferentes mas trabalhando em consonância. Envolver todos os pontos da cadeia, como stakeholders, fornecedores, clientes, e departamentos internos, de forma a estarem a par das suas necessidades e dificuldades foi também reforçado durante esta conversa, sendo apontado que a negociação deve ser uma situação de “win-win” para todos os envolvidos, em que ninguém deve ficar a perder.

O planeamento teve também um grande destaque ao longo da conversa, e que essa é uma das dificuldades da função, devido à constante urgência de tudo o que lhes é requisitado.

 

A terminar o dia, Luís Santos, senior manager da KPMG, apresentou as principais conclusões do estudo “Otimizar o procurement”, e onde analisou as tendências e a forma como está a evoluir a profissão, sendo que muitas das conclusões do estudo foram ao encontro do que foi falado ao longo do dia.

Algumas das dificuldades apontadas com maior destaque nos processos de Consulta & Negociação, Seleção e Adjudicação e Gestão de entregas foram:
. Morosidade dos processos de compra;
. Incorreto planeamento de necessidades, potenciando o cariz reativo das Compras;
. Excessiva orientação para o preço, e não consideração do Custo Total de Posse;
. Avaliação e Qualificação de fornecedores com um cariz predominantemente burocrático;
. Ausência de estratégias de sourcing e mecanismos de gestão do risco da Supply Chain;
. Insuficientes mecanismos de incentivo/ penalizações face a fornecedores/ parceiros.

“A otimização estrutural da função compras é o caminho crítico para assegurar a sustentabilidade dos benefícios alcançados, garantindo o não retorno à situação de partida e a melhoria contínua”, afirma o responsável.

Luís Santos aponta ainda que para efetuar uma transformação estrutural na função de compras, existem dois vetores a ter em conta e que devem ser trabalhados em paralelo: a estratégia e a operação. Neste sentido, confirma a ideia abordada anteriormente, de que as compras devem trabalhar “de braços dados” com as operações, para conseguirem em conjunto encontrar soluções para as necessidades reais e operacionais, e a importância de questionar o porquê de os processos serem feitos de determinada maneira e com determinadas características, e encontrando assim soluções alternativas em conjunto.

“Nós só vamos conseguir ter destaque, ter posição no board, ter respeito e ombrear com as áreas mais típicas da organização quando conseguimos ser um enabler de performance, e quando conseguimos ser parte da solução e não parte do problema”, conclui.

 

Nota: A reportagem do evento estará disponível em maior detalhe na nossa revista SCMedia News #50.