A Europa está a envelhecer — e com ela, envelhece também o perfil dos consumidores, dos pacientes e dos destinatários finais das cadeias logísticas, sendo por isso mais do que um conceito, uma tendência na logística.
Esta mudança demográfica, especialmente visível no setor da saúde, exige uma nova abordagem operacional. Mais do que uma realidade social, trata-se de uma transição estrutural com impacto direto nos modelos logísticos e regulamentares — e a logística farmacêutica está no centro desta transformação.
A chamada Silver Economy — economia orientada para a população sénior — representa atualmente mais de 20% da população europeia, com projeções que apontam para os 25% até ao final da década, segundo dados da Eurostat. Em Portugal, este número já ultrapassa os 24%, de acordo com a Euronews, o que torna a necessidade de adaptação ainda mais urgente.
Este conceito já não se limita ao setor dos serviços sociais ou à oferta de produtos médicos. Ele começa a influenciar diretamente a forma como se pensa a logística e a distribuição, pela necessidade crescente de novos serviços, segurança e experiência do utilizador. A reflexão estratégica por parte da indústria deve, por isso, dar lugar à ação.
Durante décadas, a logística foi sinónimo de eficiência, rapidez e controlo de custos. Hoje, sem abdicar desses pilares, a acessibilidade emerge como um novo imperativo estratégico. A Silver Economy obriga-nos a desenhar operações logísticas centradas no utilizador — com foco nas limitações, necessidades e expectativas de uma população mais envelhecida, muitas vezes mais vulnerável, menos digitalizada e com exigências muito específicas.
Num contexto atual dominado pela inteligência artificial e pela automação, esta realidade coloca-nos perante uma dicotomia: não podemos pensar apenas em soluções digitais para o consumidor jovem. É essencial manter o foco também nas necessidades de quem tem menor literacia digital.
É preciso preparar a logística da saúde para o envelhecimento ativo.
As implicações logísticas da Silver Economy poderão ir muito além de ajustar volumes ou redefinir rotas. Poderá implicar inovação real em várias frentes, nomeadamente:
- Embalagens otimizadas, com maior legibilidade, abertura facilitada e ergonomia adaptada às mãos envelhecidas;
- Rastreabilidade simplificada, com interfaces e comunicações pensadas para utilizadores menos familiarizados com tecnologia;
- Logística farmacêutica home care ready, em que medicamentos e dispositivos chegam ao domicílio em condições seguras, prontos para uso autónomo, com todo o impacto e mudança regulamentar que isto representaria;
- Previsibilidade operacional aumentada, com foco em minimizar a ansiedade e a dependência do utilizador em relação à chegada de bens essenciais.
Estas soluções não se esgotam na tecnologia. São, sobretudo, uma combinação de inovação, proximidade e visão estratégica — atributos que se tornarão cada vez mais diferenciadores nas cadeias de valor, especialmente no setor healthcare.
Para os profissionais e líderes das Cadeias de Abastecimento, a Silver Economy é mais do que um desafio — é uma oportunidade para criar novos standards. Num mercado onde os modelos tradicionais começam a dar sinais de esgotamento, responder às exigências da população sénior pode ser uma alavanca de diferenciação, fidelização e responsabilidade social corporativa.
Adaptar-se a este público não significa apenas fazer mais — significa fazer diferente. Com mais sensibilidade, mais previsibilidade e mais personalização. A inovação logística, neste contexto, mede-se tanto em algoritmos e sensores como em entendimento humano e propósito.
Em suma, o envelhecimento da população não é um fenómeno temporário. É um novo enquadramento demográfico que exige estratégia, investimento e visão transversal. A logística farmacêutica, sendo um elo vital entre a indústria e os cidadãos, terá um papel central na construção de soluções que respeitem e valorizem todas as fases da vida.
Porque envelhecer com dignidade não pode ser apenas uma ambição social — deve ser também uma prioridade logística.
Sandra Durães | Service Manager | Logista Pharma
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